Mais cortes na área social
O Orçamento que já
não o é e os mitos da despesa pública
É difícil comentar a execução de um Orçamento que já não o é. O Orçamento
do Estado (OE) 2013, terá que ser substantivamente alterado pelo Orçamento rectificativo. O
objectivo para o défice orçamental aumentou para 5,5% do PIB, é preciso
considerar o aumento das despesas com pensões e salários da função pública para
acomodar as decisões de inconstitucionalidade do Tribunal Constitucional, bem
como compensar os cortes previstos nos subsídios de doença e desemprego que
também foram considerados inconstitucionais.
Para além disto, as receitas fiscais foram estimadas num cenário de recessão
de 1%, quando ele agora é de 2,3%. Em suma, o rectificativo que aí vem não é apenas uma pequena
rectificação, mas uma alteração com impacto nos grandes agregados orçamentais.
De qualquer modo, o OE2013 é a base que temos e é importante
compreendê-lo para se perceber coisas tão diferentes como estas: que margem de manobra
tem (ou não tem) o Governo após as decisões do TC? Em que falamos quando referimos
“reforma do Estado”?
A figura (acima) apresenta a estrutura da despesa (consolidada) da administração
central e Segurança Social (AC+SS) orçamentada no OE, isto, é onde se retiraram
apenas as transferências para a administração regional e local. A despesa com
pensões e as despesas com pessoal representam 50% desta despesa.
Aqui a margem de manobra do Governo reduziu-se drasticamente com o
acórdão. Ao não poder mexer em salários, o Governo mexerá porventura no emprego público, o que
é muito pior.
Adicione-se agora as despesas na aquisição de serviços na área da saúde
(medicamentos, meios auxiliares de diagnóstico, aquisição de serviços a
hospitais empresarializados, etc.), as outras prestações sociais (desemprego, RSI,
CSI) e as transferências para as instituições particulares de solidariedade
social (da SS), que são quem assegura a esmagadora maioria de lares de idosos
deste país, e chegamos a 66,4% da despesa. Por fim, adicionem-se os juros da
dívida e estamos em mais de três quartos da despesa (77,6%). Desta, em 27,6 pontos
percentuais poderá haver poupanças, mas são difíceis e terão elevados custos
sociais, em particular nas áreas da saúde e da Segurança Social.
Há outra leitura dos dados que espero que contribua para acabar com um primeiro
mito em torno da “reforma do Estado”, do “peso do Estado” e das suas
“gorduras”. Da despesa consolidada da AC+SS, só cerca de um terço (38%)
corresponde a despesas com actividades do Estado. É a soma de pessoal, aquisição
de serviços (incluindo transferências para hospitais EPE) e do investimento.
Cerca de dois terços (62%) não tem nada a ver com “gorduras”, “peso” ou “máquina
do Estado”. São verbas que constituem despesa, mas “saem” sob a forma de
pensões, outras prestações sociais, juros, subsídios, transferências para IPSS,
etc. Isto nada tem a ver com o peso da “máquina” do Estado.
Outro mito é o de que se pode cortar facilmente na aquisição de bens e
serviços. Pode-se cortar algo, mas os dados mostram que mais de metade desta é
na Saúde, e portanto é difícil cortar naquela sem haver cortes nesta.
É preciso encontrar novos caminhos, mas não será nada fácil...
P.S. – No 25 de Abril de 1974, estávamos cheios de alegria e de esperança.
Hoje, apesar de todos os progressos económicos e nos direitos individuais e
sociais, estamos muito apreensivos e vivemos sob protectorado. Deixo aqui
fragmento de um poema de Jorge Luis Borges (Aprendiendo)
“Con el tiempo aprendes a construir todos tus caminos en el hoy, porque
el sendero del mañana no existe.”
Análise, Paulo Trigo Pereira JP 25.04.13
Etiquetas: Politica Nacional
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