sexta-feira, março 26, 2010

Penalizar os que não são bons

Salvador de Mello defende que é preciso «penalizar os que não são bons» . Não se pode permitir a «não qualidade»
Promover a liberdade de escolha e uma «regulação forte» são duas das propostas para reforçar a sustentabilidade do sistema de Saúde, defendeu Salvador de Mello num debate realizado recentemente no Porto.
É preciso incentivar e «premiar os melhores e penalizar os que não são tão bons», mas «é preciso assumir as consequências disso», porque «não se pode permitir a não qualidade», afirmou Salvador de Mello, num debate realizado a 25 de Fevereiro no Palacete Balsemão, no Porto, sobre o tema «Evolução dos sistemas de Saúde», em que participou também Javier Alvarez, conselheiro de Saúde da Região de Castela e Leão (Espanha). O presidente do Grupo José de Mello Saúde considerou que, em Portugal, mais cedo ou mais tarde, «tem de haver uma política de consequências quando não há qualidade».
Nas propostas que fez para resolver o problema da sustentabilidade do sistema — propostas essas, aliás, como frisou, «descomprometidas» e «despojadas de aspectos políticos» —, Salvador de Mello defendeu que a liberdade de escolha pode fazer com que as capacidades instaladas sejam mais bem aproveitadas, diminuindo as listas de espera e aumentando o acesso. O gestor defende também que a separação entre serviço público e privado deveria desaparecer. «Era muito mais importante separar financiamento e prestação do que separar público e privado», disse. A regulação «também tem de ser forte», considerou o gestor, devendo «seguir os mesmos critérios e ter os mesmos objectivos», independentemente dos intervenientes.

«Refrear a contratação»

Para Salvador de Mello, o sistema beneficiará se «refrear» o papel da contratação, reforçando o «papel concorrencial», até porque «um contratador consegue gerir bem o sistema e separar os prestadores com qualidade dos prestadores sem qualidade». E resumiu: «Em Portugal temos de evoluir em termos de contratação para que o sistema possa melhorar e maximizar a eficácia entre prestadores.»
Um outro elemento que, na visão do presidente do Grupo José de Mello Saúde, pode resolver o problema da sustentabilidade é promover maior «transparência e incentivos», apesar de alguns passos já terem sido dados. Seja como for, «deveríamos apostar numa maior transparência de resultados clínicos», defendeu Salvador de Mello, acrescentando: «As pessoas devem ser o motor da transparência e o motor do acesso à informação», e isso, «no fundo, é pretender a excelência».
Ainda a propósito da liberdade de escolha, o gestor considerou que a ADSE — Direcção-Geral de Protecção Social aos Funcionários e Agentes da Administração Pública «é um exemplo positivo e é modelo a seguir», porque «há um contratador em que existe liberdade de escolha, que pode ser exigente na contratação». Não sendo, como disse, um sistema perfeito, porque «não tem igualdade de tratamento dos prestadores, é exemplo que pode ser seguido depois de lhe serem introduzidas melhorias», acrescentou o presidente do Grupo José de Mello Saúde.

«Investigação forte»

Para Javier Alvarez, que curiosamente não seguiu o tema proposto, a promoção da investigação deve ser hoje um «investimento prioritário», mostrando que os países que estão a enfrentar melhor a crise económica «são os que têm uma investigação forte», como são os casos dos Estados Unidos e de alguns países asiáticos.
O conselheiro de Saúde da Região de Castela e Leão referiu que, em Espanha, apesar da crise, não foram reduzidas as verbas destinadas à investigação, o que «nem sempre acontece» e «é grave» não acontecer, pois, como disse, neste aspecto «nunca se recupera o tempo perdido».
Segundo o balanço que fez da situação, a Europa ocupa o segundo lugar em investigação em saúde no Mundo, embora, como disse, a décalage em relação aos Estados Unidos seja ainda muito grande. As maiores dificuldades na Europa, na sua visão, prendem-se com a falta de recursos, número de investigadores a tempo parcial, fragmentação da investigação e «falta de massa crítica». Nas contas que Javier Alvarez apresentou para a Europa (período de 2007-2013), os recursos disponíveis serão na ordem dos oito milhões de euros para os vários Estados-membros.

Investimento multiplicou

Ainda em relação a Espanha, o responsável de Castela e Leão considerou que a investigação sofreu um «enorme impulso», multiplicando seis vezes o investimento nos últimos anos, a que corresponde 2% do PIB, verba que, mesmo assim, «ainda é inferior aos níveis médios dos países da OCDE», Estados Unidos (2,65%) e Suécia (3%). Pelas suas contas, em Espanha existirá uma média de cinco investigadores por cada mil habitantes (a média da OCDE será de seis investigadores por milhar de habitantes), sendo «significativo que o sistema de Saúde espanhol ocupe dos primeiros lugares — o 7.º — no ranking que avalia os sistemas de Saúde do Mundo», disse.

Manuel Morato, Tempo de Medicina 22.03.10

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