domingo, abril 25, 2010

Já não é mau

O dia 25 de Abril é sempre uma boa altura para um balanço do regime em que vivemos, principalmente este ano em que a falência ameaça e a corrupção aumenta como nunca antes. O pessimismo foi fundo. Até, para meu espanto, um inconquistável optimista como Mário Soares nos veio dizer, segundo o DN, que há hoje mais desigualdade em Portugal do que havia em 1974, coisa que, por ser manifestamente falsa, só de facto mostra o desespero dele. E, além de Soares, meia dúzia de militares da época (Otelo, por exemplo) e o próprio Presidente Eanes reaparecerem em cena, como de costume a lamentar que a democracia não tivesse afinal correspondido ao que “o povo aspirava”, confundindo impenitentemente o povo com a minoria radicalizada do MFA e dos partidos da esquerda.

Tudo isto assenta num enorme equívoco. Em primeiro lugar, nenhuma verdadeira revolução trouxe a ninguém nada de bom. A revolução francesa atrasou o desenvolvimento industrial do país, criou 70 anos de instabilidade política e, com Napoleão, pilhou e arrasou a Europa inteira. A revolução russa conseguiu parar a evolução do império para uma sociedade burguesa e semicivilizada, fez morrer dezenas de milhões de pessoas na guerra civil, nas purgas e nos “campos de trabalho” e acabou por instalar uma das tiranias mais violentas da história. E mesmo no nosso pequeno Portugal a revolução republicana, que hoje discretamente se comemora, trouxe uma república intolerante e terrorista, que, pela sua desordem e fraqueza, introduziu a longa ditadura de Salazar.

A outra face do equívoco é a de que o “25 de Abril” não passou de um pronunciamento militar, que o Partido Comunista e alguns loucos desirmanados tentaram transformar numa revolução. Se o programa do MFA se limitasse, como devia, a dois fins legítimos – descolonizar e, assim que possível, convocar eleições –, Portugal provavelmente não teria passado pela irresponsável aventura do PREC, que desfigurou o Estado e paralisou a economia. Com a revisão constitucional de 1989, 14 anos depois, voltámos pouco a pouco a uma certa espécie de “normalidade”, insegura e precária. Mas nem por isso nos livramos dos velhos vícios da ditadura e do PREC. A regularidade e o realismo, que as circunstâncias gritantemente pediam, degeneraram na improvisação e no conflito.

De qualquer maneira, agora existe um Estado providência (imperfeito, evidentemente) e, quer queiram quer não, existe liberdade bastante. Para mim, já não é mau.
VPV, JP 25.04.10

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