sexta-feira, agosto 12, 2011

SNS está sem dinheiro.

Gestores avisam que para manter salários ficam a dever o material

A banca está a suspender o financiamento de dispositivos médicos — como seringas, luvas ou desfibrilhadores — a hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) por falta de pagamento. O presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares, Pedro Lopes, admite a ‘falência’.
“Não sei como é que os hospitais vão resistir até ao final do ano sem medidas adicionais”, avisa o gestor. E dá um exemplo: “Temos de ter verba para pagar o 13º mês e para fazer face aos ordenados o dinheiro deixará de contar para outra coisa, como fornecedores”.

E agora o problema complica-se porque os fornecedores deixam de poder contar com a ajuda dos bancos. Até aqui, as empresas davam à banca uma percentagem das faturas do SNS para receberem ‘a tempo e horas’, ficando a banca encarregada de cobrar a dívida aos hospitais. Mas esta modalidade ( factoring) está a ser recusada porque os próprios bancos não conseguem recuperar o dinheiro adiantado.

As consequências já se sentem em vários hospitais. “Começa a haver empresas a exigir o pagamento antecipado ou ‘à boca da entrega’ do produto”, explica Pedro Lopes. O administrador hospitalar diz que “a exigência está a ser feita por fornecedores exclusivos”, no entanto “as restantes empresas também podem começar a dizer que não fornecem mais”. O Ministério da Saúde (MS) responde que esta “matéria diz respeito às entidades financeiras e fornecedores”, mas recomenda que os hospitais ‘fechem os cordões à bolsa’. “Temos conhecimento das dívidas das unidades de saúde a fornecedores e, por isso mesmo, e dado o momento de dificuldade que o país atravessa, deve existir um redobrado esforço de contenção, particularmente ao nível das compras como medicamentos e aquisição de serviços”.

O Banco Espírito Santo é uma das entidades de factoring que cortou o apoio ao SNS, mas explicou ao Expresso que a decisão não afeta “integralmente o financiamento ao sector de equipamentos para hospitais, apenas alguns casos”. A saber: “Em que não há pagamento de dívidas desde 2009; tendo sido atingido o limite de exposição ao risco de crédito não é, pois, possível aceitar mais endividamento dessas entidades públicas”.

Dados da Associação Portuguesa das Empresas de Dispositivos Médicos (Apormed) mostram que os hospitais públicos demoram 430 dias a saldar as dívidas. “Não há na nossa história uma demora desta dimensão; até aqui a espera era inferior a um ano”, diz o presidente da Apormed, Luís Pereira. Por isso, a Associação Portuguesa de Leasing, Factoring e Renting é taxativa: “É imperativo e urgente o retorno a padrões aceitáveis em matéria de prazos de pagamento”.

O montante que os hospitais públicos devem à banca por via do factoring não é divulgado por questões de sigilo, mas o presidente da Apormed dá uma pista: “O mercado de dispositivos médicos movimenta anualmente perto de 700 milhões de euros, 80% dos quais no segmento das unidades do SNS”.

Todos os intervenientes no sector esperam agora que o ministro da Saúde cumpra a palavra, impondo o pagamento atempado no SNS e diga como vai saldar os três mil milhões de euros em dívida aos fornecedores. “Até ao momento não temos nenhuma indicação”, afirma o representante dos administradores hospitalares. E Pedro Lopes ‘põe o dedo na ferida’: “O Ministério da Saúde deve milhões de euros aos hospitais, continua sem pagar, há contas por fechar e não temos uma mina de ouro”. Pedro Lopes alerta: “O sistema está muito complicado”.

Ainda assim, a solução não está à vista. O gabinete do ministro Paulo Macedo salienta que se está “ainda numa fase, que se supõe breve, de apuramento das contas e das dívidas de cada unidade, portanto só no final do ano estará o MS em condições de informar sobre o plano de pagamento das dívidas das unidades a fornecedores”. Contas feitas: “O plano de pagamentos será executado ao longo dos primeiros meses do próximo ano”. E não está garantido que os hospitais sejam os primeiros a receber —“É o Governo, como um todo, que determina as prioridades financeiras do Estado”, esclarece o MS.

semanário expresso 06.08.11

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