quinta-feira, dezembro 13, 2007

Desemprego

é o que mais preocupa os jovens médicos

A alteração do Código Deontológico é, aos olhos de muitos jovens médicos, uma questão "remota". Receiam é que não haja vagas
Os novos médicos têm novas dificuldades que a Ordem dos Médicos (OM) não tem conseguido acompanhar, resume Paula Gama, médica a fazer o primeiro ano de especialidade no Instituto Português de Oncologia de Coimbra. A opinião é partilhada por alguns jovens médicos e finalistas de Medicina com quem o PÚBLICO falou. Hoje é dia de eleições na Ordem para o período entre 2008 e 2010.
"Sinto-me distante da OM", confessa Paula Gama, médica de 30 anos que está a tirar a especialidade de patologia clínica. "As propostas [dos candidatos] não trazem nada de novo: unir os médicos, defender os médicos. É uma Ordem virada para dentro", lamenta, quando os problemas da nova geração de profissionais são bem concretos.
Fala, em primeiro lugar, da dificuldade de colocação nos internatos da especialidade, um processo cada vez mais complicado e por vezes "injusto", assunto que a ordem não tem ajudado a resolver. E os hospitais são cada vez menos receptivos às despesas implicadas na formação dos jovens médicos internos. "Essa é uma questão nova. As novas dificuldades estão a surgir muito mais depressa do que a OM as consegue acompanhar", frisa.
1500 novos alunos por ano
Depois, há a questão do mercado de trabalho. "Não tenho dúvidas de que a médio prazo vai haver desemprego na classe médica", admite Luís Ruano, estudante de Medicina no último ano do curso, que nota cada vez mais esta preocupação em colegas. "Há dez anos entravam 500 alunos por ano, hoje é quase o triplo", sem contar com os portugueses que rumam a países como a República Checa e Espanha para tirar o curso e que depois vão querer voltar ao país, refere o finalista do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (Porto).
Roberto Pinto, 24 anos, a uma cadeira de terminar Medicina na Faculdade de Medicina do Porto, diz que com o número de alunos que entram nas faculdades a formação pós-graduada está a tornar-se "incomportável" e a empregabilidade é "um problema real". O finalista acredita que a alteração do Código Deontológico dos Médicos é, aos olhos de muitos jovens médicos, uma questão "remota". "Preocupam-se com a empregabilidade, se vai haver vagas."
Coordenador do conselho nacional do médico interno, órgão consultivo da OM, Rui Guimarães é mais comedido. Há seis anos, quando acabou o curso, havia "muito poucos jovens nos candidatos a cargos executivos da OM". "Hoje não há lista que se arrisque a não ter um ou dois médicos abaixo dos 30 ou 35 anos", acentua.
Admite, porém, que nas faculdades ninguém explica para que serve a OM, e que "a Ordem tem falhado um pouco" a este nível. Muitos médicos têm, por outro lado, a ideia de que a instituição serve para puni-los, ainda que "a maior parte das sanções se fique pelas chamadas de atenção".
Só um terço vota
Mas o que mais apoquenta os jovens é mesmo a segurança e estabilidade. "A ideia feita de que ser médico é igual a ter emprego está em risco." E hoje já não há a garantia de que se poderá dar formação de qualidade a todos. "Os hospitais recusam-se a abrir mais vagas." O problema já se fez sentir no ano passado e este ano está a acontecer de novo.
Sobre a elevada abstenção - normalmente, só um terço dos médicos vota e o ritmo da votação por correspondência este ano indica que o problema se mantém -, o jovem clínico acredita que isto é "um sinal de que os médicos estão confortáveis". Curiosamente, são os mais velhos os que menos votam. Os jovens participam mais, até porque "serão os mais afectados pela performance do bastonário".
A presidente da Associação Nacional de Estudantes de Medicina, Cláudia Melo, depois de ter perdido dois anos porque "só tinha média de 18,4", diz que nesta fase - está a concluir o curso - o que a preocupa mais é a formação pré-graduada. A OM, lamenta, "trabalha mais na formação pós-graduada". Olha também com preocupação para o anunciado aumento do numerus clausus e as implicações que daí poderão advir por não haver estrutura formativa para aguentar este rimo. "Para quê formar muitos médicos se não forem bons médicos?"
Uma coisa sabe ao certo. Quando começar a ter direito de voto, não irá abster-se.
jp, AC, CG, 12.12.07