quarta-feira, novembro 21, 2007

Medicamentos Inovadores


A dificuldade de acesso aos medicamentos inovadores para o tratamento do cancro está a ser discutida em toda a Europa. Uma achega à discussão foi dada, recentemente, no “European Congress Conference of Oncology”, realizado em Barcelona, durante o qual o sistema britânico foi severamente criticado por oncologistas europeus. Em Portugal, a questão também já saltou para as páginas dos jornais, devido à queixa de um médico – que alertou para um doente oncológico em estado terminal que não teve acesso a medicamentos inovadores - e a respectiva posição da Ordem dos Médicos. link

Mas será que há mesmo restrições? A GH ouviu alguns especialistas que sublinham a necessidade de haver critérios bem definidos para a prescrição destes fármacos.
Em Barcelona, num workshop subordinado ao tema “A Question of Time – are people with cancer missing out?”, as críticas dirigiram-se unanimemente contra o NICE - National Institute for Health and Clinical Excelence que, no Reino Unido, decide que medicamentos são introduzidos no serviço nacional de saúde, após a sua aprovação pela Agência Europeia de Medicamentos (EMEA).

Segundo Joaquim Bellmunt, Chefe do Serviço de Oncologia do Hospital Del Mar em Barcelona, “a subvalorização das indicações terapêuticas e a não comparticipação no caso dos medicamentos mais dispendiosos, são algumas das razões que levam à desvalorização deste Instituto”, que já é apelidado de “nasty” (maldoso). O NICE, sublinharam alguns dos congressistas, em nove anos de actuação, e com duas mil propostas de medicamentos apresentadas, somente aprovou 35.
No âmbito do Congresso Europeu foi referido, por diversas vezes, que as terapêuticas oncológicas inovadoras estão a ser condicionadas em toda a Europa, inclusive em Portugal, ao nível da comparticipação e prescrição, mesmo após a aprovação dada pela EMEA.

Para Ricardo da Luz, presidente do conselho de administração do Instituto Português de Oncologia de Lisboa (IPO) nunca é demais sublinhar que o sistema britânico é diferente do nosso. Depois da aprovação da EMEA, o NICE analisa os medicamentos na perspectiva do seu custo/benefício e decide sobre a sua introdução ou não no sistema público de saúde britânico. No nosso país, frisa, esta avaliação é feita pelo INFARMED que, em alguns casos, discute qual a comparticipação do Estado no preço do fármaco.
O passo seguinte é dado pelos hospitais. São estes “e não uma estrutura central que tomam essa decisão de introduzir ou não o medicamento”, explica. Ricardo da Luz não considera que haja “entraves”, mas frisa que não está a par da situação específica de outras unidades hospitalares. Estes fármacos devem ser avaliados caso a caso e são-no em cada hospital. “E os hospitais têm opiniões diversas”, salienta Ricardo da Luz. E acrescenta: “Não se pode dizer que se esteja a atrasar a entrada dos medicamentos inovadores. É perigoso e simplista reduzir a questão a se é inovador ou não”.

Racionalização
Luís Costa, director do Serviço de Oncologia do Hospital de Santa Maria, afirma que, embora “não possa dizer que haja restrições à aprovação de medicamentos, há restrições à sua introdução no ambiente hospitalar”.
Após a aprovação dos medicamentos, tem de ser feita a “análise de custo/ efectividade e esta tem de ter em conta os recursos próprios dos hospitais”.
Luís Costa sublinha que se “tudo o que são medicamentos inovadores são aprovados é porque têm algum benefício para os doentes, mas a sua utilização deve ser feita com critérios” e os “hospitais devem ter a responsabilidade de saber responder pelos critérios com que os utilizam, dentro da lei”.
Esta é uma decisão das comissões de farmácia e terapêutica de cada hospital e a palavra-chave para Luís Costa é responsabilização.

Os médicos devem explicar aos conselhos de administração quais são os critérios pelos quais se deve reger a prescrição destes fármacos.
Até para que o próprio conselho de administração possa ter uma expectativa de custos, aponta. No entanto, o director do serviço de Oncologia do Hospital de Santa Maria frisa com veemência que, a haver “restrições por critérios meramente económicos e sem atender aos critérios de benefício clínico, isso transporta um conceito muito grave”.
De acordo ainda com Luís Costa, “quem prescreve, o médico, deve ter a responsabilidade de saber justificar perante o seu conselho de administração qual o benefício clínico e a escolha dos doentes” a quem determinado medicamento inovador é prescrito.
Para Ricardo da Luz, do IPO, levanta-se também outra questão. “É preciso saber se o medicamento que dizem ser inovador, introduz realmente alguma inovação” e este é um ponto que a EMEA não avalia, sublinha.

Para este especialista, em “oncologia médica o que se passa é que os medicamentos não devem ser avaliados individualmente, isoladamente, mas em conjunto, no total do tratamento” até porque nem todos os medicamentos que a indústria vende como inovadores o são na realidade.

Segurança
Uma outra questão que não pode ser esquecida no âmbito desta discussão é a segurança dos doentes. Um medicamento inovador pode até ser tóxico para alguns doentes e piorar a sua situação clínica. Até porque, aponta o dirigente do IPO, muitos deles são “aprovados, muitas vezes, com pressão da indústria” e esta é uma matéria que não pode ser escamoteada.
A segurança dos pacientes e a toxicidade de alguns destes fármacos inovadores é um assunto que também preocupa Helena Gervásio, presidente da Sociedade Portuguesa de Oncologia (SPO). “Nós utilizamos esses novos fármacos, quando justificados, independentemente do custo, mas é preciso fazer uma racionalização e ter critérios, saber o benefício em termos de sobrevivência, de qualidade de vida, versus o custo”, frisa.

A toxicidade destes medicamentos deve ser ponderada. Um medicamento inovador “pode dar mais sobrevida mas com menos qualidade de vida”, acrescenta a presidente da SPO.
Por seu turno, Ricardo da Luz afirma que, no IPO, nem todos os medicamentos são introduzidos “porque achamos que alguns não são tão seguros”. Estes “fármacos são apenas mais um medicamento no tratamento da doença, não o tratamento”, afirma, acrescentando que “há inovação e benefício” mas também é preciso evitar dar “falsas expectativas aos doentes”.
GH n.º 31