segunda-feira, dezembro 21, 2009

Reforma HHs, os CRIs

Estes são os modelos a criar dentro dos hospitais e este é um dos objectivos para esta legislatura»; «desenvolver na área hospitalar outros modelos de gestão interna para os hospitais terem maior responsabilidade e maior autonomia», sejam estes «CRI ou outros [modelos] que criem condições diferentes” disse Ana Jorge, aludindo ao Programa de Governo.
“Os CRIs parecem ser a nova fórmula mágica da política de saúde de Ana Jorge. Como foram no passado esperança e fracasso rotundo”, opina a Helena. Contrapõe-lhe o Tavisto que “Os CRI não têm passado, a não ser no papel. Ou melhor, actualmente existe apenas o do Serviço de Cirurgia Torácica dos HUC, uma espécie de cavalo de Tróia, que, podendo ser alvo de críticas, tem sido uma réstia de esperança de novos modelos organizativos hospitalares e o oposto de “um fracasso rotundo”.
Sempre ouvi críticas ao CRI dos HUC, podendo resumi-las na dúvida de saber se, (pelo montante de recursos que mobiliza num contexto de inequívoca escassez – o que suscita a questão da equidade na atribuição dos recursos de que as instituições dispõem –), o SNS pode ter o objectivo de eleger esse como modelo a generalizar. Nenhuma reserva ouvi incidindo sobre a qualidade ou a quantidade da produção atingida pelo CRI dos HUC.

Interessante parece-me o que refere, a encerrar, o texto publicado pelo Tempo de Medicina (30.11.09): “Decifrando o discurso, percebe-se que Ana Jorge está consciente de que os profissionais, para dedicarem plenamente o seu tempo ao hospital, devem ser pagos em conformidade”, o que é indiciador claro das expectativas (não lhes discuto a legitimidade, só a oportunidade!) e das condições que exigem para o sucesso deste “objectivo para esta legislatura”. Porque, indiscutivelmente, será necessário que existam as condições necessárias e há, também aqui, um problema de sustentabilidade.

Diz o Tavisto, e eu com ele: “Esperemos que esta medida não seja só para épater” mas traduza uma real vontade de alterar a orgânica hospitalar em geral e rapidamente alastre a outras unidades”; e enuncia algumas das condições para tal necessárias: mais autonomia, maior responsabilização e maior dedicação profissional, coerência interna que evite a “balcanizacão” e a selecção adversa, formas de financiamento que tenham em linha de conta estas realidades, processos de comparação de custos de CRI afins, e de auditoria que detectem eventuais desvios ás melhores práticas clínicas. Muita coisa, como bem se vê. Que AJ o escute, Tavisto, para não queimarmos o que poderia ser uma boa oportunidade e não ficarmos apenas com os respectivos custos.

Já agora, porque vem muito a propósito de toda esta problemática, esclarecendo conceitos e a interdependência que não pode ser ignorada na definição de objectivos, e porque exige menos tempo do que a leitura do relatório da sustentabilidade, não resisto a recomendar a leitura do excelente artigo "The role and education of doctors in the delivery of health care", de Cyril Chandler, publicado no Lancet 1999; 353: 1178–81 link

Aidenos

Economico said
Existe uma perspectiva que a mim me assusta de sobremaneira. Nós os que pelos HH nos vamos mexendo sabemos da pouca autonomia dos Conselhos de Administração das próprias instituições, que em lutas internas – fratricidas – muitas vezes se desgastam.
Não posso deixar de concordar com a possibilidade bem real da “balcanização” dos HH, já de si muito divididos entre especialidades e cabeças-de-cartaz, ao que se soma a “desnatação” dos doentes frequente em situações em que se aplicou o Pay-for-Performance com modelos simples.
Se num determinado HH ou Centro Hospitalar passar a existir um CRI, que recursos é que poderão e deverão ser alocados para lá, e mais, qual o reforço orçamental para o HH pelo facto de criar um CR?. Mas mais do que todo isto, o que me preocupa é saber de quem é a responsabilidade – a tal a que se refere o Centro de Responsabilidade Integrada – é da Administração do HH ou é de um responsável interno do CRI.
Imaginemos que o CRI se prova como sendo um fracasso, o responsável pelo mesmo leva uma sanção pelo mau desempenho ou culpa – como nós nos temos vindo a habituar – a Administração por não o promover e encher de recursos. No extremo oposto se o CRI se mostra como uma mais-valia imensa para a saúde pública, os recursos gerados são distribuídos pelo restante HH ou são consumidos pelo CRI até este se transformar num monstro.
Como diria um médico que conheço – ao que me lembro citando um Professor seu – “… quem não tem competência, não se estabelece…”, o problema é que todos se querem estabelecer, mais que não seja para que o órgão de decisão do HH não possa tomar decisões que afectem o CRI.
Numa nota final afirmo que não sou contra os serviços de excelência, bem pelo contrário, estes promovem o HH e o serviço de saúde no seu todo, devem ser fomentados e financiados de forma a que eles próprios criem a evidência clínica necessária ao seu funcionamento – se possível - ou estejam sempre dentro do estado da arte. O resultado positivo de um bom CRI é um bom resultado para o sistema de saúde, pois permite tratar mais e melhor os doentes que dele necessitam.

helena said...
Quanto a mim os CRIs servem apenas para desequilibrar a estrutura da débil organização dos hospitais.
Os serviços organizados em CRIs adquirem naturalmente maior importancia em relação aos demais serviços do Hospital. Traduzida em melhor acesso ao financiamento e condições de gestão em geral.

O que é prioritário é dar maior autonomia à gestão dos nossos hospitais, acompanhada da nomeação de gestores hospitalares competentes, pondo termo ao compadrio instalado no nosso MS.
E quanto a isto, há coisas que nunca hão-de mudar...

aidenós said...
Caro Economico:

A simples decisão, por si só, não resolve, mesmo se publicada no DR.. Usando a expressão da Helena: não há fórmulas mágicas, e, mesmo os truques de magia, precisam de muito trabalho a precedê-los.
O Tavisto referiu alguns dos items que devem ser previamente trabalhados e resolvidos para que os CRI sejam bem sucedidos. Tanto no âmbito dos próprios CRI como no seu meio envolvente. Infelizmente, no contexto actual, duvido que haja ânimo para levar essa tarefa a bom termo.
A leitura atenta do texto de Cyril Chantler (não Shandler, como erradamente escrevi) poderá responder a algumas das suas preocupações ou dar as respostas que faltam para que os CRI sejam o que deles se espera. Para além disso, o texto mostra como não fazem sentido alguns mitos com os quais, muitas vezes, muitos tentam fugir das realidades ou das imposições do contexto que é o nosso e verdadeiramente condicionante.
É evidente que criar condições que têm a ver com mudança de mentalidades, sobretudo dos profissionais, exige tempo e determinação que parecem faltar; mas ficar pela mera criação dos CRI não é mais que lançar balões que vão rebentar por não aguentarem a pressão. Tudo isso é triste e já não sei se também não é fado!

cffc said...
O poder politico ainda não percebeu que o problema não está nos modelos (SA, EPE, CR, CRI, Departamentos, Serviços, Unidades funcionais), mas sim em aspectos mais simples do ponto de visto conceptual, nomeadamente:

Como introduzir nas organizações hospitalares, critérios de justiça, no contexto, de decisões técnicas, visando o interesse geral – em detrimentos de decisões politica, visando, unicamente, interesses pessoais?
Qual a pertinência dos Conselhos de Administração – politicamente tolhidos – como órgãos colegiais?
Qual o papel do poder político local e os interesses internos e externos?
Quem detém, na prática, o poder num hospital?
Em que sentido uma comunicação eficiente entre níveis hierárquicos é importante para o exercício da autoridade?
De que modo comunicação e delegação de poderes podem ser encarados como substitutos na gestão da actividade produtiva?

Simples e facilmente difícil, senão difícil.

Permitam-me citar DRUCKER (Drucker, 2001).
“A administração existe em função dos resultados da instituição. Tem de começar com os resultados pretendidos e de organizar os recursos da instituição de modo que atinja esses resultados. É o órgão que faz com que a instituição – empresa, universidade, hospital – seja capaz de produzir resultados fora dela própria”.

Acrecento: Em saude, normalmente, quanto aos resultados/beneficos, as decisões politicas – contrárias aos ditames técnicos – trazem enormes beneficios para o proprio e reduzidos (ou nenhuns) beneficos para as populações, no entanto, decisões técnicamente fundamentadas, quase sempre resulta em enormes beneficos para as populações e para o interesse geral, e alguns dissabores para os dicisores.
É assim o nosso Portugal. Continuemos contentes e alegres até ao dia em que vai doer muito mais.

Economico said...
Sem querer tornar demasiado académica a nossa reflexão, deixo aqui dois artigos sobre o Pay-for-performance (P4P) e a sua relação com a qualidade da prestação de cuidados médicos. O primeiro artigo é de SNYDER, Lois; NEUBAUER, Richard L.; Pay-for-Performance Principles That Promote Patient-Centered Care: An Ethics Manifesto Ann Intern Med. 2007; 147:792-794; O segundo é de Rowe John W., Pay-for-Performance and Accountability: Related Themes in Improving Health Care Ann Intern Med. 2006;145:695-699.
O meu auxilio a esta reflexão passa acima de tudo por recolocar as necessidades do doente num lado da equação e a escassez de recursos no outro extremo e não pela criação de serviços, unidades ou centro de responsabilidade por decreto. De certo que a preocupação com a eficiência, a eficácia e efectividade juntamente com a distribuição equitativa dos recursos e o uso ponderado e reflectido dos mesmos se coloca sempre que um sistema é posto em uso. No plano teórico-legislativo é assim que as coisas nos aparecem. O que falta, julgo eu, e muito honestamente, é convencer alguns elementos do hospital a olhar para além do caso individual (muito embora a sua formação académica os tenha preparado assim) e a outros convencer da necessidade de tratar de forma individual o doente (apesar da sua formação lhes disser para seguir os grandes números) é uma difícil tarefa mas que resultaria melhor se todos discutisse-mos mais estes assuntos. Como disse Lifepassanger falta o tal factor multidisciplinar que apregoamos utilizar à anos.

Simplesmente Constança said...
Olho para a bola e vejo... dum lado os sindicatos a quererem tudo, indiferentes à préfalência do Estado, do outro vejo os medicamentos a disparar, os hospitais a resvalar, mais médicos estrangeiros a "arrivar", cuidados continuados a começar a pesar, a gripe com pouco mais para dar (falar) ...

Apetece seguir o Jesus e recomendar à MS e SEs: "Juntem-se os três e façam um quadrado"!

DrFeelGood said...
«Experiências isoladas»

Sobre a generalização do modelo, Luís Campos, que foi um dos editores do livro Governação dos Hospitais, publicado em Setembro, afirma que «veria com melhores olhos a opção de avançar com um hospital piloto, em que todos os serviços funcionassem segundo este modelo», ao invés de se «estarem a criar experiências isoladas que funcionam como lagos estanques». Isto num contexto em que o que se deveria privilegiar seria «uma rede complexa de canais interligados». «A melhor atitude», segundo o internista, «é estimular a diversidade, avaliar as experiências». Mas, na sua opinião, não é isso que tem acontecido: «O primeiro CRI foi criado há 10 anos. Que vantagens trouxe? Que inconvenientes? Que impacte na eficiência, na qualidade, no acesso? Estimula a selecção adversa?» Uma série de questões às quais gostaria de ter resposta «para entrar de forma mais confiante nestas novas experiências». Isto, além de que, frisa, «não se pode ficar por aqui», até porque, «quando se fala na criação de CRI parece que todos os outros serviços têm sido centros de irresponsabilidade, o que não é verdade». E explica que fazer da «qualidade dos cuidados, a segurança dos doentes e o combate ao desperdício uma responsabilidade partilhada por profissionais de saúde, gestores e políticos, e enquadrando-os no contexto mais global da governação do sistema de Saúde» será «o maior desafio que os hospitais enfrentam».
Para o presidente da APAH, a organização em CRI é algo para que os administradores hospitalares estão receptivos. Apesar de só existir ainda o CRI de Cirurgia Cardiotorácica dos Hospitais da Universidade de Coimbra, Pedro Lopes afirma que «os administradores hospitalares sempre defenderam este modelo». E reforça a ideia dizendo que «quem tem responsabilidades de gestão, quer de topo, quer intermédias, sempre percebeu a importância da criação de modelos intermédios de gestão», pelo que o papel dos conselhos de administração (CA) num hospital organizado em CRI «deverá ser aquele que lhe está determinado por lei e pelo mandato que lhe foi conferido», nomeadamente o «papel de liderança estratégica, como consta dos bons “manuais de Gestão”». Apesar disso, o administrador admite que «infelizmente» há membros dos CA que «preferem actuar como se de verdadeiros operacionais se tratassem, invadindo terrenos que não são seus e descurando a sua verdadeira função».

Tempo medicina 07.12.09

DrFeelGood said...
Pedro Lopes e Luís Campos falam sobre o anúncio da criação de CRI em Lisboa
Administrador esperançado médico expectante

Luís Campos é desfavorável à criação de «experiências isoladas» com CRI. Pedro Lopes coloca menos entraves à adopção deste modelo e diz mesmo que a dimensão do hospital é um «pormenor».
Se o presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH), Pedro Lopes, vê o anúncio — noticiado na nossa edição de 30/11 — da intenção de se avançar com três centros de responsabilidade integrada (CRI) como «informações esperançosas de reabilitação» deste modelo, já o director do Serviço de Medicina IV do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental, Luís Campos, é mais comedido e afirma que «a ideia dos CRI» lhe parece «interessante, enquanto forma de reforçar a gestão intermédia e ligar a autoridade clínica à capacidade real de gestão dos recursos».
Reservas que poderão estar relacionadas com o facto de o internista ser de opinião que «este modelo é mais apetecível para determinadas especialidades», nomeadamente as que «desenvolvem uma actividade altamente rentável para o hospital e [que têm] elevada complexidade». E exemplifica que a Medicina Interna e a Pediatria, «cuja actividade se baseia em ouvir a história dos doentes, examiná-los, rever os exames complementares, formular hipóteses diagnósticas, fazer um plano, prescrever, informar e aconselhar», representa uma tarefa «seguramente mais demorada e menos espectacular». Por isso, acaba por ser «pouco valorizada no seio do Serviço Nacional de Saúde», pelo que «para estas especialidades, os CRI não têm tanto poder de atracção». Trata-se, portanto, de um «modelo mais apetecível para unidades que são características de hospitais centrais».
Por seu lado, Pedro Lopes parece encarar a generalização dos CRI com menos restrições. Questionado sobre o facto de tendencialmente os CRI estarem a surgir em grandes hospitais, à excepção do Centro Hepato-Bilio-Pancreático e de Transplantação do Hospital de Curry Cabral, o que é considerado um entrave à evolução pelo seu responsável, Eduardo Barroso, o administrador contrapõe que «os ganhos que o modelo pode oferecer encontram-se na reengenharia do processo organizacional, sendo a dimensão da instituição um pormenor». É por isso que diz que «este modelo pode e deve ser implementado em hospitais de grande, média e até pequena dimensão». Apesar disso, admite que «as instituições de maior envergadura criam sinergias mais significativas do que as de menor dimensão».

TEMPO MEDICINA 07.12.09

Brites said...
A história dos CRIs é uma não história com mais de 20 anos.

1º Parte

Os Centros de Responsabilidade, previstos no artigo 9.º do decreto-lei 19/88, constituem um meio previsto pelo legislador para obter “a maior eficiência técnica e social” dos hospitais.
Acreditar que, em ambiente de Função Pública tradicional, seria possível desenvolver os princípios da gestão empresarial foi pura ingenuidade.
A Administração Pública Clássica constitui um sistema burocrático, estando por isso marcada pelas características da burocracia.
A Burocracia Weberiana é um modelo onde, em tese, prevalecem a competência técnica, a promoção meritocrática, a profissionalização da gestão e se procura garantir a previsibilidade de funcionamento.
Na prática o modelo apresenta disfunções que são conhecidas: internalização das regras e exagero no apego aos regulamentos, excesso de formalização, despersonalização das relações, absoluta conformidade em relação às rotinas, exibição de sinais de autoridade, conflitos com o publico, dificuldade de atendimento dos clientes e, “ last, but not least,” resistência à mudança.
O modelo burocrático promove a estabilidade, que é, obviamente, um valor a ter em conta. Mas quando está em jogo uma mudança profunda, como é a necessária a permitir a descentralização dos poderes de gestão, a burocracia é completamente inadequada.
Por isso não foram criados Centros de Responsabilidade, à excepção do Centro de Responsabilidade de Cirurgia Torácica dos HUC, que constitui isso mesmo; a excepção que confirma a regra.
Dez anos passados, e mantendo-se o mesmo estatuto hospitalar, o MS tentou, de novo, implantar Centros de Responsabilidade. Uma equipa de projecto criada por Despacho Ministerial elaborou os Princípios e Regras de Funcionamento dos Centros de Responsabilidade Integrados nos Hospitais. Com base nesse estudo, a DGS emitiu um Despacho pedindo aos Hospitais - a todos - o envio do “desenho organizacional em CRI” da instituição, num prazo inferior a 30 dias.
Esse pedido deu origem a vários disparates, o maior dos quais protagonizado pelo CA de um pequeno hospital, com cerca de 100 camas, que terá proposto a criação de mais duma dezenas de CRIs. Não consta que os proponentes tivessem sido demitidos, com justa causa.
Sobre o Documento da equipa de projecto a APAH produziu um parecer onde, se afirmava “ Parece-nos que as preocupações manifestadas e expectativas preconizadas, pressupõem uma alteração prévia do “ambiente” em que se exerce a gestão hospitalar, não se vislumbrando condições objectivas e subjectivas para que, de imediato se implementem, com consistência e profundidade formas intermédias de administração.”
Uma dessas condições tinha a ver, em minha opinião, com o estatuto jurídico dos hospitais. Por isso tive a esperança que a empresarialização hospitalar criasse o ambiente propício à descentralização da gestão através da criação dos CRIs.

2º Parte

Tudo parece ter continuado na mesma e eis-nos de novo, 21 anos depois da consagração em lei dos CRs a discutir o tema. E, em minha opinião a abordar o assunto, mais uma vez, de forma errada.
A criação de um ou outro CRI, num ou noutro hospital, não tem qualquer sentido. Do que realmente se trata é, como aliás se pedia no Despacho da DGS, de organizar em CRIs todo o hospital.
Só que não se pode pretender a utilização deste modelo em todos os hospitais, independentemente da sua dimensão e complexidade, nem, tão pouco, pedir o desenho duma solução no prazo de 30 dias.
A reorganização dum hospital em CRIs deve ser encontrada no âmbito do planeamento estratégico.
Sabemos que a análise estratégica tem por finalidade pôr em relevo as vias mais favoráveis ao desenvolvimento duma organização, num contexto incerto e evolutivo, de modo a optimizar os recursos disponíveis.
Cremadez define bem as características duma boa estratégia. Esta deve ser:
- Aberta, dando prioridade às necessidades específicas do seu envolvimento.
- Objectiva, confrontando os dados concretos com a subjectividade dos “ actores”, de modo a produzir uma reflexão isenta dos elementos de ordem ideológica e corporativa.
- Positiva, identificando os factores chave do sucesso sem os confundir com aquilo que os profissionais sabem ou gostam de fazer.
- Realista, constituindo um quadro de referência através do qual a sucessão aleatória de oportunidades possam ser rapidamente avaliadas.
- Compulsiva, facilitando o exercício das responsabilidades e obrigando os responsáveis sectoriais a conceber planos de acção incorporados numa visão de conjunto.
A estratégia aparece-nos assim como um elemento fundamental da integração.
As principais forças centrífugas num hospital são o corporativismo e a diferenciação.
A primeira dilui-se no âmbito do grupo de trabalho. O sentimento de pertença ao grupo e a necessidade de colaboração geram laços de união no seio dum serviço, mas constituem também factores de diferenciação organizacional.
Para a contrabalançar, sem destruir a coesão dos grupos da base, é necessário situar cada sector no contexto da actividade global da instituição. Ou seja, é necessário fazer participar cada responsável na definição da estratégia institucional.
Não acompanho alguns Colegas do Blog que receiam que a criação dos CRIs possa conduzir à balcanização do Hospital.
A balcanização já existe e é fruto da centralização de poderes e da atomização do Centro Operacional. Na ausência duma estratégia global, elaborada com a participação dos diversos actores, cada Serviço define a sua própria estratégia e desenvolve a sua actividade, sem preocupações de articulação com os outros elementos do sistema, nem com os objectivos estratégicos da instituição.
A constituição de estruturas funcionais, agrupando vários centros de custo com actividades homogéneas ou afins, dotadas da necessária autonomia, usando poderes adequadamente desconcentrados e compartilhando as responsabilidades correspondentes aos poderes exercidos, parece-me, ao contrário, um meio adequado de combater a balcanização.
O termo compulsivo utilizado por Cremadez para caracterizar a estratégia pode chocar espíritos mais sensíveis. Mas não podemos retirá-lo do seu contexto. Quando se fala em desconcentrar poderes nos CRIs não se está a dizer que estes devem dispor de total autonomia.
Na prática, os graus de autonomia constituem um contínuo, sendo necessário, em cada caso, precisar os seus limites, em função das condições concretas existentes. O que se trata, no fundo, é de estabelecer contratos de gestão entre o CA e os CRIs.
E os contratos, meus Caros Amigos, os contratos são para cumprir.

Tavisto said...
A constituição de estruturas funcionais, agrupando vários centros de custo com actividades homogéneas ou afins, dotadas da necessária autonomia, usando poderes adequadamente desconcentrados e compartilhando as responsabilidades correspondentes aos poderes exercidos, parece-me, ao contrário, um meio adequado de combater a balcanização.

Concordo em absoluto com o que Brites diz. Repare porém que, até agora, este princípio não esteve na base da constituição de nenhum dos CRI existente(s) ou que se anunciam. Ao invés de se agruparem serviços afins, o que se assiste é à transformação de cada serviço num CRI. É por isso que falo em risco de balcanização, pois se assiste a uma maior autonomia económico-financeira sem maior partilha de responsabilidades intersectoriais.
Esta nossa dificuldade em trabalhar em equipa explica provavelmente o disparate do CA do pequeno hospital com cerca de 100 camas que teria proposto a criação de mais duma dezenas de CRIs. Imagino pois que cada director do que quer que fosse quereria ter o seu CRI. Desta forma não teria de partilhar responsabilidades e talvez viesse a ter um orçamento acrescido.
Quando alerto para o risco da balcanização, refiro-me pois ao perigo de passarmos do actual modelo centralizador para uma espécie de feudalismo gestionário, resultante duma concentração excessiva de poderes nos directores dos CRI com consequente perda de eficácia global do todo hospitalar.

Brites said...
Caro Tavisto:

Ainda bem que concorda com o meu comentário. E presumo que também concordará com um outro ponto que, por razões de economia do texto, não referi.
É o caso de se ter difundido a ideia de que a criação dum CRI é sinónimo de atribuição de mais recursos. Ora isto é um contra-senso, já que foram introduzidos na lei como um meio de permitir aumentar a “eficiência técnica e social” dos hospitais (nº1 do art.º 7 e nº1 do art.º 9 do dec-lei 19/88).
Que a peregrina ideia de aumento de custos contrarie o espírito e a letra da lei, que acolheu a possibilidade da organização dum hospital em CRI, tenha feito o seu caminho, deve-se, provavelmente, à percepção que existe em relação ao CRI de Cirurgia Torácica dos HUC.
Mas o Serviço de Cirurgia Torácica dos HUC é um Centro de Excelência e é nessa perspectiva que pode servir de exemplo para outros Centros de Excelência que, tal como o Economico, entendo que devem existir e ser objecto de alguma discriminação positiva.
A organização do hospital em CRI é outra coisa e parece-me pertinente recordar parte da longa introdução do dec-lei 19/88.:
“Quanto à forma de prestação, a evolução deverá processar-se no sentido de o actual, modelo vir a ser substituído por soluções que propiciem a necessária visão global do doente e garantam a melhor cooperação interdisciplinar.
Relativamente ao dimensionamento das unidades funcionais, essa evolução deverá encaminhar-se na direcção de novas formas de divisão do trabalho por universos mais extensos, compreensivos e menos estanques e, por isso, mais conformes com a crescente necessidade de concentração tecnológica.”
O Dr. Luís Campos, citado por DrFeelGood , tem toda a razão para estar contra a “criação de experiências isoladas.
Conceptualmente o decreto-lei 19/88 estava correcto. Que, passados 21 anos, estejamos neste estado só mostra como, em Portugal, a realidade está longe da norma jurídica.

Economico said...
Nem não querendo tenho que concordar com Tavisto e Brites. Eu explico melhor.
Ficámos, e espero não estar errado, presos à ideia de que o centro de responsabilidade de Cirurgia Torácica dos HUC seria o modelo a seguir. E esse eventual modelo a seguir implica mais recursos quer materiais, quer financeiros.
Se organizarmos o nosso pensamento para uma linha próxima do pensamento do Balanced Scorecard (BSC) poderemos alterar um pouco essa visão. Assim se tomarmos o Serviço de Cirurgia Torácica como um centro de excelência não o poderemos comparar com outros centros de responsabilidade, pois o primeiro terá sempre benefícios que as restantes unidades funcionais não poderão ter.
Apesar disto não foi esse o entendimento do tal HH de 100 camas e não só do seu CA. A ideia da moda – sim, porque aqui como noutros sítios existe uma moda e ela é muitas vezes repescada de outras eras – é o de rebaptizar os serviços em CRI e não tornar elementos homogéneos ou capazes de gerar mais eficiência juntos, numa única unidade elementar do sistema de saúde.
Ao contrário do caso citado, a construção do novo Hospital de Todos-os-Santos e a própria reorganização do Centro Hospitalar de Lisboa Central (CHLC) tendem no sentido contrário, o de criar pólos giratórios à volta do doente, onde até a própria arquitectura do edifício contempla a existência de quartos individuais – agora que se chegou à conclusão que as infecções nosocomiais podem ser diminuídas desta forma. Nada disto impede, a meu ver, a criação de CRI e a sua propagação como modelo de gestão hospitalar.
Só mais um ponto que me parece sempre importante de referir. A desresponsabilização dos CA, que ocorre por duas razões muito objectivas, uma por num importante número de casos não ser o CA a decidir sobre qual a política interna a seguir na sua unidade hospitalar (e mais tarde isto irá alastrar aos ACS) tendo que seguir instruções demasiado directas da tutela, e noutro por manifesta inércia de alguns CA para se oporem e dirigirem alguns serviços hospitalares por estes terem um peso desmedido quer em termos internos quer externos, nomeadamente junto do MS. A criação de CRI neste contexto é extremamente complicada até porque os CA teriam de ter um grau de responsabilidade e liberdade que até agora não foi possível obter em Portugal. Sublinho responsabilidade pelas decisões tomadas (o que envolve a perda de mandatos, comissões de serviços e afins) e liberdade para tomar as decisões sobre a criação de CRI e a nomeação de quem as dirige (sem influências externas à normal “politica interna” da organização, que como é obvio existe sempre).