Contra o estilo de Gestão Medieval
O tema que proponho aos leitores desta publicação interessa tanto aos cidadãos e utentes dos serviços de saúde como aos profissionais de saúde.
Num período histórico em que o discurso dominante em Portugal insiste em conceitos como 'produtividade', 'competitividade' e ‘competências’ torna-se urgente expandir a reflexão nacional sobre estes desafios e abordar as causas dessas consequências. Ou seja, devemos procurar identificar e entender algumas fontes (causas) organizacionais da tal apregoada escassez de 'competências', falta de 'competitividade' e baixa 'produtividade' (as consequências) das organizações portuguesas.
Reparem os leitores que, numa nota essencialmente histórica, o estilo de gestão dominante durante os anos de 1950 no mundo industrializado (nomeadamente E.U.A. e Europa) era caracterizado por uma série de motivos deturpadores dos princípios da livre concorrência e respeito pelos cidadãos assim como castradores da inovação e originalidade de soluções organizacionais. Nesse período longínquo (?) da história das organizações, os colaboradores (funcionários) da organização eram percebidos como uma comodidade facilmente substituível. A atitude para com os clientes era pobre e desrespeitadora, aceitando-se o desperdício e o erro como inevitáveis, embora se assumisse uma postura agressiva de 'cortar nos custos', se necessário (e por ser mais fácil) à custa dos funcionários.
Este era também um 'estilo de gestão' que desencorajava, mais ou menos abertamente, a inovação de mercado dando lugar a preconceitos do género 'para quê inventar a roda quando é tão fácil copiar?'. Neste contexto organizacional considerava-se 'fundamental' a capacidade de encontrar fornecedores cada vez mais baratos e adoptava-se uma política exclusiva de 'oportunismo' em relação à oferta (ignorando a estratégia e o esforço de posicionamento de marketing cujo significado, de resto, se desconhecia). Na essência, este era um estilo de gestão orientado única e exclusivamente para a produção, daí a inovação de mercado, ou seja a adopção da ciência do marketing e a respectiva colocação do cidadão no centro das decisões, ser inexistente.
Como nos confirmam vários autores e analistas investigadores internacionais , este estilo de gestão, que designo aqui ironicamente como 'estilo de gestão medieval', mantém-se indefinidamente no poder se a organização reunir condições como a subserviência total dos funcionários, a procura exceder a oferta no seu sector de actividade, as expectativas dos clientes/utilizadores se mantiverem baixas e a situação macro-económica se mantiver inalterável (vide tabela 1).
O resultado deste estilo de gestão era (e é onde ele ainda se verifique), um contexto organizacional de extrema mediocridade, incompetência(s), desleixo, desrespeito pelos clientes/utentes, desperdício, acidentes e danos pessoais aos colaboradores e clientes a que acrescia a total incapacidade de inovar uma vez que a única mudança 'legitimizável' e aceite nesta tipologia de cultura organizacional se reduz à mera imitação medíocre 'daquilo que outros criaram e resultou bem'. Repare aliás o leitor, só como exemplo, nas imitações que outros sites começama a fazer do qualidadeonline ...
Num período histórico em que o discurso dominante em Portugal insiste em conceitos como 'produtividade', 'competitividade' e ‘competências’ torna-se urgente expandir a reflexão nacional sobre estes desafios e abordar as causas dessas consequências. Ou seja, devemos procurar identificar e entender algumas fontes (causas) organizacionais da tal apregoada escassez de 'competências', falta de 'competitividade' e baixa 'produtividade' (as consequências) das organizações portuguesas.
Reparem os leitores que, numa nota essencialmente histórica, o estilo de gestão dominante durante os anos de 1950 no mundo industrializado (nomeadamente E.U.A. e Europa) era caracterizado por uma série de motivos deturpadores dos princípios da livre concorrência e respeito pelos cidadãos assim como castradores da inovação e originalidade de soluções organizacionais. Nesse período longínquo (?) da história das organizações, os colaboradores (funcionários) da organização eram percebidos como uma comodidade facilmente substituível. A atitude para com os clientes era pobre e desrespeitadora, aceitando-se o desperdício e o erro como inevitáveis, embora se assumisse uma postura agressiva de 'cortar nos custos', se necessário (e por ser mais fácil) à custa dos funcionários.
Este era também um 'estilo de gestão' que desencorajava, mais ou menos abertamente, a inovação de mercado dando lugar a preconceitos do género 'para quê inventar a roda quando é tão fácil copiar?'. Neste contexto organizacional considerava-se 'fundamental' a capacidade de encontrar fornecedores cada vez mais baratos e adoptava-se uma política exclusiva de 'oportunismo' em relação à oferta (ignorando a estratégia e o esforço de posicionamento de marketing cujo significado, de resto, se desconhecia). Na essência, este era um estilo de gestão orientado única e exclusivamente para a produção, daí a inovação de mercado, ou seja a adopção da ciência do marketing e a respectiva colocação do cidadão no centro das decisões, ser inexistente.
Como nos confirmam vários autores e analistas investigadores internacionais , este estilo de gestão, que designo aqui ironicamente como 'estilo de gestão medieval', mantém-se indefinidamente no poder se a organização reunir condições como a subserviência total dos funcionários, a procura exceder a oferta no seu sector de actividade, as expectativas dos clientes/utilizadores se mantiverem baixas e a situação macro-económica se mantiver inalterável (vide tabela 1).
O resultado deste estilo de gestão era (e é onde ele ainda se verifique), um contexto organizacional de extrema mediocridade, incompetência(s), desleixo, desrespeito pelos clientes/utentes, desperdício, acidentes e danos pessoais aos colaboradores e clientes a que acrescia a total incapacidade de inovar uma vez que a única mudança 'legitimizável' e aceite nesta tipologia de cultura organizacional se reduz à mera imitação medíocre 'daquilo que outros criaram e resultou bem'. Repare aliás o leitor, só como exemplo, nas imitações que outros sites começama a fazer do qualidadeonline ...
E o sector da Saúde?
O clima organizacional descrito acima, identifica um cenário de gestão deprimente sobre o qual deveremos reflectir no intuito de discutirmos se ele não se verificará ainda em alguns sectores da sociedade portuguesa. Sem nos deixarmos influenciar por preconceitos contra ou a favor do sector público ou privado, devíamos questionar-nos sobre quantas organizações nacionais serão dominadas por este estilo de gestão em qualquer sector da economia portuguesa...
Na verdade, os estudos que verifiquem esta hipótese no que diz respeito a Portugal, escasseiam (como muito do que exige competências por exemplo para realizar estudos pragmáticos e concretos para as industrias nacionais). Todos nós, profissionais de saúde e executivos do sector, docentes universitários, consultores do sector da saúde (e de outros sectores) tal todos os cidadãos utentes dos serviços de saúde sabemos aquilo que vemos, ouvimos e sentimos: este estilo de gestão medieval impera em grande número de organizações de saúde portuguesas. Quer dizer, parece que ele existe mas não se escreve. Por isso, não vem nos livros...
No entanto, torna-se difícil negar as consequências do estilo de gestão medieval sobre as organizações de saúde em geral e sobre os seus profissionais em concreto: a profunda desmotivação para a inovação assim como o óbvio desinteresse na temática do aumento de produtividade ou aquisição de novas competências reais (excluindo de entre estas a aquisição de 'certificados de presença para o currículo').
É também difícil negar que os colaboradores das organizações de saúde continuam a ser percebidos como uma comodidade facilmente substituível a menos que sejam escassos o que, mesmo assim, apenas suscita um comedimento nesta atitude. È também difícil negar a aceitação fácil do erro e do desperdício como inevitável e, sobretudo, sem consequências de maior para o responsável.
Por outro lado, quem pode negar a adopção (que se avizinha ainda mais agressiva) da 'intervenção de gestão' para 'cortar nos custos'? Infelizmente, parece que esta intervenção se poderá limitar à visão redutora de corte sobretudo nos custos das despesas correntes com os colaboradores (ou seja os seus salários e/ou o seu número total) por ser muito mais fácil que analisar e intervir sobre outros custos operacionais (i.e. desperdícios) como por exemplo os advindos de fenómenos complexos como a chamada 'medicina defensiva' ou a resistência à transferência de investimento para os cuidados primários e domiciliários onde os custos são, na verdade, muito inferiores e os ganhos em saúde muito superiores...
É igualmente difícil negar que o estilo de gestão dominante nas organizações de saúde desencoraja a inovação dando lugar à atitude medíocre da cópia fácil do que se faz ou tenta fazer em outros países, considerando-se também muito positiva a capacidade de encontrar fornecedores cada vez mais baratos (embora nas organizações públicas do estado esta abordagem seja muito mais difícil por condicionantes diversas, normalmente burocráticas).
Também não é fácil negar que seja dominante a orientação exclusiva da 'análise de gestão' para a produção (que outra forma preferem os actuais responsáveis?) ignorando-se, quase em absoluto, as expectativas e desejos dos cidadãos ou, mais grave ainda, os efeitos da intervenção das organizações de saúde (i.e.: que resultados e impacto sobre a população? que ganhos em saúde? E como medi-los?). Todas estas evidências difíceis de negar levam-nos a pensar no tal estilo de gestão medieval...
Até Quando?
No entanto, a sobrevivência do estilo de gestão medieval parece estar em 'perigo'. Embora a oferta continue a ser inferior à procura (quiçá através de processos de mercado pouco naturais), a verdade é que as outras condições já não se verificam no que diz respeito ao sector de actividade das organizações de saúde: há um nítido abandono da atitude de subserviência dos profissionais de saúde ás estruturas rígidas de poder organizacional (e respectiva atrofia das dinâmicas e funções de gestão); há um aumento de expectativas dos cidadãos e utentes dos serviços de saúde; e, mais fundamental ainda, a situação macro-económica nacional e internacional alterou-se profundamente. Assim, e não podendo expandir cada um destes aspectos por escassez de espaço, temos que afirmar o seguinte: o estilo de gestão medieval verificado no sector da saúde está condenado à substituição por um novo estilo de gestão.
Pois é a procura de um novo estilo de gestão em saúde que se afirma como o paradigma pedagógico, académico e cientifico a adoptar na educação dos novos gestores para o sector da saúde de acordo com os seguintes princípios e regras fundamentais:
1) O sector da saúde não se limita ao serviço nacional de saúde e, por isso mesmo, o jovem gestor em saúde deve estar preparado para analisar e intervir nas diferentes áreas da industria da saúde (desde o sector farmacêutico, ás tecnologias da saúde, seguros de saúde, serviços de cuidados domiciliários, etc.).
2) Devemos promover a especialização nesta industria, onde é fundamental que se combata a cultura generalista que leva a que se pense e aceite que 'qualquer um pode ser gestor no sector da saúde'.
3) O sector da saúde é específico e complexo demais para que licenciados em áreas da gestão geral sejam considerados em igualdade de circunstâncias com os detentores de uma licenciatura de gestão em saúde no que diz respeito ao processo de integração em postos de gestão nas organizações do sector (para não falar em outra áreas de formação universitária ainda mais distantes da saúde);
4) Que uma formação de quatro anos (ao nível da licenciatura) não é nem de longe comparável a uma pós-graduação de gestão em saúde nas competências que atribuí aos seus discentes. Estas últimas, sendo complementares e avançadas, terão que ser sempre muito mais específicas no seu objecto e atribuição de novas competências. A negação deste princípio conduz e reforça a atitude generalista apontada acima e reforça o risco de fazer das pós-graduações em saúde um mero produto oportunista.
5) Que os conteúdos e estratégia de desenvolvimento académico e cientifico destes novos profissionais garantam as competências para enfrentar os desafios de reforma para a inovação e produtividade conforme identificados na tabela 1 deste artigo.
É este o meu apelo à reflexão nesta temática estratégica para o sector da saúde nacional.
O clima organizacional descrito acima, identifica um cenário de gestão deprimente sobre o qual deveremos reflectir no intuito de discutirmos se ele não se verificará ainda em alguns sectores da sociedade portuguesa. Sem nos deixarmos influenciar por preconceitos contra ou a favor do sector público ou privado, devíamos questionar-nos sobre quantas organizações nacionais serão dominadas por este estilo de gestão em qualquer sector da economia portuguesa...
Na verdade, os estudos que verifiquem esta hipótese no que diz respeito a Portugal, escasseiam (como muito do que exige competências por exemplo para realizar estudos pragmáticos e concretos para as industrias nacionais). Todos nós, profissionais de saúde e executivos do sector, docentes universitários, consultores do sector da saúde (e de outros sectores) tal todos os cidadãos utentes dos serviços de saúde sabemos aquilo que vemos, ouvimos e sentimos: este estilo de gestão medieval impera em grande número de organizações de saúde portuguesas. Quer dizer, parece que ele existe mas não se escreve. Por isso, não vem nos livros...
No entanto, torna-se difícil negar as consequências do estilo de gestão medieval sobre as organizações de saúde em geral e sobre os seus profissionais em concreto: a profunda desmotivação para a inovação assim como o óbvio desinteresse na temática do aumento de produtividade ou aquisição de novas competências reais (excluindo de entre estas a aquisição de 'certificados de presença para o currículo').
É também difícil negar que os colaboradores das organizações de saúde continuam a ser percebidos como uma comodidade facilmente substituível a menos que sejam escassos o que, mesmo assim, apenas suscita um comedimento nesta atitude. È também difícil negar a aceitação fácil do erro e do desperdício como inevitável e, sobretudo, sem consequências de maior para o responsável.
Por outro lado, quem pode negar a adopção (que se avizinha ainda mais agressiva) da 'intervenção de gestão' para 'cortar nos custos'? Infelizmente, parece que esta intervenção se poderá limitar à visão redutora de corte sobretudo nos custos das despesas correntes com os colaboradores (ou seja os seus salários e/ou o seu número total) por ser muito mais fácil que analisar e intervir sobre outros custos operacionais (i.e. desperdícios) como por exemplo os advindos de fenómenos complexos como a chamada 'medicina defensiva' ou a resistência à transferência de investimento para os cuidados primários e domiciliários onde os custos são, na verdade, muito inferiores e os ganhos em saúde muito superiores...
É igualmente difícil negar que o estilo de gestão dominante nas organizações de saúde desencoraja a inovação dando lugar à atitude medíocre da cópia fácil do que se faz ou tenta fazer em outros países, considerando-se também muito positiva a capacidade de encontrar fornecedores cada vez mais baratos (embora nas organizações públicas do estado esta abordagem seja muito mais difícil por condicionantes diversas, normalmente burocráticas).
Também não é fácil negar que seja dominante a orientação exclusiva da 'análise de gestão' para a produção (que outra forma preferem os actuais responsáveis?) ignorando-se, quase em absoluto, as expectativas e desejos dos cidadãos ou, mais grave ainda, os efeitos da intervenção das organizações de saúde (i.e.: que resultados e impacto sobre a população? que ganhos em saúde? E como medi-los?). Todas estas evidências difíceis de negar levam-nos a pensar no tal estilo de gestão medieval...
Até Quando?
No entanto, a sobrevivência do estilo de gestão medieval parece estar em 'perigo'. Embora a oferta continue a ser inferior à procura (quiçá através de processos de mercado pouco naturais), a verdade é que as outras condições já não se verificam no que diz respeito ao sector de actividade das organizações de saúde: há um nítido abandono da atitude de subserviência dos profissionais de saúde ás estruturas rígidas de poder organizacional (e respectiva atrofia das dinâmicas e funções de gestão); há um aumento de expectativas dos cidadãos e utentes dos serviços de saúde; e, mais fundamental ainda, a situação macro-económica nacional e internacional alterou-se profundamente. Assim, e não podendo expandir cada um destes aspectos por escassez de espaço, temos que afirmar o seguinte: o estilo de gestão medieval verificado no sector da saúde está condenado à substituição por um novo estilo de gestão.
Pois é a procura de um novo estilo de gestão em saúde que se afirma como o paradigma pedagógico, académico e cientifico a adoptar na educação dos novos gestores para o sector da saúde de acordo com os seguintes princípios e regras fundamentais:
1) O sector da saúde não se limita ao serviço nacional de saúde e, por isso mesmo, o jovem gestor em saúde deve estar preparado para analisar e intervir nas diferentes áreas da industria da saúde (desde o sector farmacêutico, ás tecnologias da saúde, seguros de saúde, serviços de cuidados domiciliários, etc.).
2) Devemos promover a especialização nesta industria, onde é fundamental que se combata a cultura generalista que leva a que se pense e aceite que 'qualquer um pode ser gestor no sector da saúde'.
3) O sector da saúde é específico e complexo demais para que licenciados em áreas da gestão geral sejam considerados em igualdade de circunstâncias com os detentores de uma licenciatura de gestão em saúde no que diz respeito ao processo de integração em postos de gestão nas organizações do sector (para não falar em outra áreas de formação universitária ainda mais distantes da saúde);
4) Que uma formação de quatro anos (ao nível da licenciatura) não é nem de longe comparável a uma pós-graduação de gestão em saúde nas competências que atribuí aos seus discentes. Estas últimas, sendo complementares e avançadas, terão que ser sempre muito mais específicas no seu objecto e atribuição de novas competências. A negação deste princípio conduz e reforça a atitude generalista apontada acima e reforça o risco de fazer das pós-graduações em saúde um mero produto oportunista.
5) Que os conteúdos e estratégia de desenvolvimento académico e cientifico destes novos profissionais garantam as competências para enfrentar os desafios de reforma para a inovação e produtividade conforme identificados na tabela 1 deste artigo.
É este o meu apelo à reflexão nesta temática estratégica para o sector da saúde nacional.
Paulo Kuteev Moreira
<< Home