quinta-feira, abril 13, 2006

Papel do Estado


Cumprimento o Tonitosa que, p/ nível da s/ crítica, só pode ser pessoa de alto gabarito intelectual e conhecimento teórico muito sólido. C/ estas opiniões temos oportunidade de aprender!
Estamos de acordo globalmente e nas questões técnicas - sobre a aplicação à saúde (apenas discutirei a saúde) temos porventura pequenas diferenças de opinião. Aproveito p/ alinhavar algumas ideias s/ o tema e fazer um desafio aos bloguistas.

1º- Papel do Estado na Saúde?
I - Não defendo o "Estado Mínimo" c/ Saúde entregue a Grupos Privados Lucrativos, porque:
a)- A Saúde é um bem essencial em que a intervenção do Estado garante simultaneamente coesão social e equidade - distribuição "equitativa" p/ diferentes pessoas e locais (não apenas onde é rentável financeiramente).
b)- O processo de produção de saúde é muito exigente e de características muito próprias:
i)- Deve começar em primeiro p/ promoção da saúde e prevenção da doença (em todos os serviços de saúde e locais) - como normalmente não é fácil medir os privados fazem, qd muito, os mínimos;
ii)- Produção deve ser no tipo de serviço (local) e tempo apropriados, sob coordenação de cuidados/actividades apertada e c/ papel de apoio/orientação do doente bem feito p/ benefício geral (p/ ensino e auto-cuidados, p/ garantir aceitabilidade e cumprimento da prescrição, etc.).
c)- Saúde não é como outras actividades ("indústrias") em que tudo é fácil de medir/avaliar e em que mais produtos (actos) consumidos é melhor. É reconhecida a dificuldade de avaliar e controlar, o que põe problemas:
i)- Custo de monitorizar e controlar é muito elevado e deve ser levado à conta da maior eficiência (antecipada) dos privados;
ii)- Custo dos actos a mais e perigos (ex. infecções, morte) c/ financiamentos que se relacionam c/ produção e incentivos aos profissionais p/ produzirem (ainda que não seja pagamento p/ acto) - no financiamento p/ capitação o risco de actos a menos existe e será sempre difícil destrinçar se resultados se devem aos cuidados de saúde ou a outros factores (autores dizem q efeito dos cuidados saúde será menor q 10% ...);
d)- A concorrência na Saúde é importante (p/ maior qualidade e eficiência e p/ evitar orientação e captura p/ profissionais) mas a cooperação também o é - p/ vezes o interesse/estratégia dos grupos privados lucrativos não facilita/fomenta a cooperação (ou oferece apenas a que é medida/controlada!). Seguiria p/ a Saúde a opinião de pessoa de altíssimo gabarito "Existem frequentemente objectivos, sociais por exemplo, de uma sociedade que não são totalmente alcançados pelo livre funcionamento do mercado que podem exigir respostas diferentes da promoção da concorrência mas surgem normalmente como excepção" (PPB).Tem havido promiscuidade entre políticos (governos) e grandes Grupos Económicos em Portugal, o que prejudica o funcionamento do mercado (concorrência) e a adequada regulação p/ Estado. Porque na Saúde seria diferente?
e)- O desvio do contrato e a estatística “criativa” na saúde (gerando consequências negativas p/ o país) é possível e difícil de detectar: i)- Seleccionar doenças (ex. de menor risco; que garantem maior margem), doentes (ex. mais graves, mais afluentes) e incrementar codificações (“upcoding”); ii)- Multiplicar actos desnecessários (ex. MCDT ou CE quando pagas ao acto; internamentos quando podia ser Cir. Ambulatória ou H Dia), ineficazes ou c/ diferenciação maior que necessário (ex. RMN vs Rx).
II - Papel dos privados (lucrativos/não lucrativos)?
a)- Os problemas acabados de referir são mais graves c/ privados lucrativos e de grande capacidade de influenciar o Estado, os quais podem “trabalhar” melhor os aspectos listados no ponto 1ºe) extraindo vantagens económicas indevidas à custa de: dificuldades do Estado em controlar; desconhecimento e ausência de reclamação dos doentes. Lembro a propósito: o ridículo que foi ver o Estado e Grupo de Saúde reivindicando ambos terem a haver soma muito substancial (!); dificuldade revelada pelo Estado p/ acompanhar e controlar essa concessão.
b)- Quando o Estado tem menor intervenção na produção de serviços de saúde a grande maioria dos prestadores são não lucrativos (ex. Holanda e EUA) - esta realidade tem sido esquecida (escondida) em Portugal.
III - Há falhas do Estado mas também há óbvias falhas do mercado!!
a)- A comparação entre modelos c/ maior intervenção do Estado (SNS) e maior papel do mercado (ex. EUA) mostra que aqui há maiores problemas em eficiência macroeconómica e em protecção do rendimento e equidade - acredito q sejam melhores em qualidade e eficiência micro.
b)- Eficiência macroeconómica: na recta de regressão traçada c/ PIB e despesas de saúde (ambos per capita e em PPC) os países c/ SNS estão, na maioria, abaixo da linha (valor esperado) – EUA está muito acima (gasta muito mais do que s/ nível riqueza permitia esperar), Portugal está também acima da linha.
c)- Protecção do rendimento e equidade: basta ter mais de 48 milhões de pessoas nos EUA excluídos do acesso ao sistema (salvo em urgência) p/ o desqualificar nestes objectivos! (que um Europeu não compreende nem aceita).
d)- Unidades nos EUA serão mais eficientes, c/ melhor tempo de resposta e qualidade. Os SNS têm que importar os métodos de gestão, aumentar a concorrência e a escolha e melhorar a regulação do sistema.
e)- Temos em Portugal aspectos que são talvez o pior dos 2 sistemas, s/ que se obtenham todos os seus benefícios.
SemMisericordia