Defender a Saúde em Portugal
As declarações de CC no Seminário sobre Financiamento da Saúde, referindo a possibilidade de voltarmos a ter “Porcionistas” e “Gratuitos”, caíram que nem uma bomba com os estilhaços a espalharem-se em várias direcções. Sobre este assunto gostaria de deixar aqui três pequenas notas.
1ª- Desdramatizar
CC é um dos nossos melhores Investigadores e Estudiosos/Peritos em Saúde com um brilhantismo e capacidade de analisar a Saúde por todos reconhecido – incluo-o no grupo restrito das Quatro Maiores Estrelas actuais dos AH. Não duvidamos que pretende melhorar a Saúde e o SNS, embora por vezes as suas afirmações (mediatizadas) pareçam não o acompanhar nesse desejo.
As mudanças que se propõe fazer não suscitaram contestação política significativa (grande consenso implícito?) mas quem trabalha na Saúde sabe como serão difíceis de aplicar, sobretudo num quadro em que já se impuseram sacrifícios e se retiraram “direitos”. O MS estará porventura entre a espada e a parede:
– A espada são os constrangimentos orçamentais (OE e MF) e económicos (necessidade de produzir melhores resultados em saúde usando menos recursos do País) que empurram para a continuidade de reformas com vista à racionalização do SNS e do Sistema de Saúde (maior qualidade e eficácia com o mesmo dispêndio);
– A parede são as pressões para aumento das despesas dos lobbies (Área farmacêutica, Prestadores, Profissionais, Associações de doentes, etc.) e manutenção do status quo, “mais e melhores serviços, sem nenhum encargo ou responsabilidade adicional” (autarcas, população e politiqueiros).
Neste enquadramento não surpreende que por vezes o Perito/Investigador ressurja e se sobreponha ao Ministro “anti-político” que por vezes parece ser. Esta tendência, a acontecer, será mais marcante em períodos em que o papel de Ministro seja especialmente difícil e já terá acontecido também aos que o antecederam (MS).
2ª- Lembrar
De facto convém lembrar outro Perito de extraordinário prestígio, Dr. Paulo Mendo, que teve a coragem de afirmar publicamente, várias vezes, uma convicção semelhante: defendeu que as pessoas pagassem parte dos cuidados em função da sua rendimento/IRS (isenção para quem não tivesse determinado rendimento). No mesmo plano pode considerar-se também o desejo expresso pelo Dr. Luís Filipe Pereira de pagamento de taxas moderadoras diferenciadas, em função da capacidade de pagar.
É para mim pacifico que estas afirmações sempre pressuporiam, antes de serem levadas à prática, de três condições concretizadas sina qua non:
– O apoio do Primeiro-Ministro e do Partido (do Secretário Geral?);
– Um debate nacional a que se siga um amplo consenso político;
– A alteração da Constituição.
A sua aplicação imediata não está (não estava) por isso em causa.
Poderia considerar-se para sustentação daquelas posições a teoria do “balão de ensaio” em que se poderia pensar que se teria garantido aquele apoio prévio ou, no mínimo, o acordo implícito do 1º Ministro/SG. Compreende-se esta teoria num quadro pré-eleitoral e como rampa de lançamento de ideias, o que agora não tem qualquer cabimento. Resta assim a possibilidade de CC, num ambiente de alguma informalidade e considerando uma perspectiva teórica e de longo prazo, ter deixado que o Investigador se soltasse demasiado e se sobrepusesse ao MS.
3ª- Reafirmar
Finalmente uma nota mais técnica e de opinião pessoal quanto ao que se justifica fazer/o que nos espera.
Começaria por questionar se os problemas de financiamento do SNS se resolvem injectando-lhe mais dinheiro dos doentes que possam pagar?
Penso que não, pelo menos imediatamente, visto que quem pode pagar veria os seus impostos reduzidos em conformidade, daí que para o Estado a diferença entre o que receberia de impostos e o que pagaria ao SNS não se alterava (!), ressalvada a alteração de padrão de consumo (se houvesse menor consumo sim, mas os mecanismos de co-pagamento estimulam mais o recurso ao sector privado onde os preços são mais altos e há mais indução de actos, pelo que o resultado seria até negativo!).
Depois acredito que globalmente os recursos que chegam à Saúde (% do PIB) são suficientes, daí que o que se justificaria seria essencialmente a reformulação do Sistema de Saúde e da oferta e não do seu financiamento. Considero que os impostos são a melhor forma de financiar o SNS, sendo no entanto necessário garantir equidade e eficácia no seu pagamento. As taxas moderadoras devem ser ajustadas, anual e “automaticamente” em função da evolução do custo dos actos e também, quando o sistema estiver a funcionar normalmente, devem poder ter ajustamento excepcional em situações de procura inapropriada pelo doente.
Assim não haverá opção à racionalização do Sistema e do SNS, sendo de destacar medidas do seguinte teor:
1. Garantir cuidados primários de qualidade e imediatamente acessíveis a toda a população;
2. Ajustar a oferta hospitalar:
– Novos hospitais e remodelação/expansão dos que se justificarem, devolução dos restantes aos proprietários (as Câmaras Municipais poderão querer oferecer maior disponibilidade e associar-se a outras entidades para oferecer à população outros cuidados, eventualmente com co-pagamentos);
– Garantir qualidade e eficiência em todos os hospitais, diminuindo desse modo a procura/aquisição de actos injustificados (ex. MCDT p/ os quais a capacidade actual é não só suficiente como excedentária!);
– Encerrar as urgências e maternidades que já não se justificam e, em geral, cumprir a RRH;
3. Redefinir o âmbito do pacote de cuidados que o SNS garante, alargando substancialmente nos cuidados primários e continuados e limitando a utilização inapropriada de meios sofisticados (ex. hospitais);
4. Continuar o caminho de contratualização exactamente como tem sido efectuado: contratos com entidades públicas (HH EPE e USF/CS) e instituições privadas (sociais) que disponham dos requisitos necessários de qualidade (alargamento progressivo do horizonte temporal);
5. Extinguir a prazo os Subsistemas públicos, fomentando a criação de uma Organização Integrada de Cuidados para todos os funcionários: Estado pagaria uma % fixa anual, os beneficiários contribuiriam de modo a garantir o equilíbrio financeiro da OIC;
6. Continuar as medidas na área difícil do medicamento;
7. Etc., etc...
A agenda sendo essencial é também longa e complexa, daí exigir-se um adequado planeamento e gestão da mudança.
Pela sua importância nacional todos desejamos sucesso pleno ao Sr. MS, o apoio no terreno sem dúvida que lho daremos porque doutro modo é o nosso SNS que ficará em causa!
SemMisericordia
1ª- Desdramatizar
CC é um dos nossos melhores Investigadores e Estudiosos/Peritos em Saúde com um brilhantismo e capacidade de analisar a Saúde por todos reconhecido – incluo-o no grupo restrito das Quatro Maiores Estrelas actuais dos AH. Não duvidamos que pretende melhorar a Saúde e o SNS, embora por vezes as suas afirmações (mediatizadas) pareçam não o acompanhar nesse desejo.
As mudanças que se propõe fazer não suscitaram contestação política significativa (grande consenso implícito?) mas quem trabalha na Saúde sabe como serão difíceis de aplicar, sobretudo num quadro em que já se impuseram sacrifícios e se retiraram “direitos”. O MS estará porventura entre a espada e a parede:
– A espada são os constrangimentos orçamentais (OE e MF) e económicos (necessidade de produzir melhores resultados em saúde usando menos recursos do País) que empurram para a continuidade de reformas com vista à racionalização do SNS e do Sistema de Saúde (maior qualidade e eficácia com o mesmo dispêndio);
– A parede são as pressões para aumento das despesas dos lobbies (Área farmacêutica, Prestadores, Profissionais, Associações de doentes, etc.) e manutenção do status quo, “mais e melhores serviços, sem nenhum encargo ou responsabilidade adicional” (autarcas, população e politiqueiros).
Neste enquadramento não surpreende que por vezes o Perito/Investigador ressurja e se sobreponha ao Ministro “anti-político” que por vezes parece ser. Esta tendência, a acontecer, será mais marcante em períodos em que o papel de Ministro seja especialmente difícil e já terá acontecido também aos que o antecederam (MS).
2ª- Lembrar
De facto convém lembrar outro Perito de extraordinário prestígio, Dr. Paulo Mendo, que teve a coragem de afirmar publicamente, várias vezes, uma convicção semelhante: defendeu que as pessoas pagassem parte dos cuidados em função da sua rendimento/IRS (isenção para quem não tivesse determinado rendimento). No mesmo plano pode considerar-se também o desejo expresso pelo Dr. Luís Filipe Pereira de pagamento de taxas moderadoras diferenciadas, em função da capacidade de pagar.
É para mim pacifico que estas afirmações sempre pressuporiam, antes de serem levadas à prática, de três condições concretizadas sina qua non:
– O apoio do Primeiro-Ministro e do Partido (do Secretário Geral?);
– Um debate nacional a que se siga um amplo consenso político;
– A alteração da Constituição.
A sua aplicação imediata não está (não estava) por isso em causa.
Poderia considerar-se para sustentação daquelas posições a teoria do “balão de ensaio” em que se poderia pensar que se teria garantido aquele apoio prévio ou, no mínimo, o acordo implícito do 1º Ministro/SG. Compreende-se esta teoria num quadro pré-eleitoral e como rampa de lançamento de ideias, o que agora não tem qualquer cabimento. Resta assim a possibilidade de CC, num ambiente de alguma informalidade e considerando uma perspectiva teórica e de longo prazo, ter deixado que o Investigador se soltasse demasiado e se sobrepusesse ao MS.
3ª- Reafirmar
Finalmente uma nota mais técnica e de opinião pessoal quanto ao que se justifica fazer/o que nos espera.
Começaria por questionar se os problemas de financiamento do SNS se resolvem injectando-lhe mais dinheiro dos doentes que possam pagar?
Penso que não, pelo menos imediatamente, visto que quem pode pagar veria os seus impostos reduzidos em conformidade, daí que para o Estado a diferença entre o que receberia de impostos e o que pagaria ao SNS não se alterava (!), ressalvada a alteração de padrão de consumo (se houvesse menor consumo sim, mas os mecanismos de co-pagamento estimulam mais o recurso ao sector privado onde os preços são mais altos e há mais indução de actos, pelo que o resultado seria até negativo!).
Depois acredito que globalmente os recursos que chegam à Saúde (% do PIB) são suficientes, daí que o que se justificaria seria essencialmente a reformulação do Sistema de Saúde e da oferta e não do seu financiamento. Considero que os impostos são a melhor forma de financiar o SNS, sendo no entanto necessário garantir equidade e eficácia no seu pagamento. As taxas moderadoras devem ser ajustadas, anual e “automaticamente” em função da evolução do custo dos actos e também, quando o sistema estiver a funcionar normalmente, devem poder ter ajustamento excepcional em situações de procura inapropriada pelo doente.
Assim não haverá opção à racionalização do Sistema e do SNS, sendo de destacar medidas do seguinte teor:
1. Garantir cuidados primários de qualidade e imediatamente acessíveis a toda a população;
2. Ajustar a oferta hospitalar:
– Novos hospitais e remodelação/expansão dos que se justificarem, devolução dos restantes aos proprietários (as Câmaras Municipais poderão querer oferecer maior disponibilidade e associar-se a outras entidades para oferecer à população outros cuidados, eventualmente com co-pagamentos);
– Garantir qualidade e eficiência em todos os hospitais, diminuindo desse modo a procura/aquisição de actos injustificados (ex. MCDT p/ os quais a capacidade actual é não só suficiente como excedentária!);
– Encerrar as urgências e maternidades que já não se justificam e, em geral, cumprir a RRH;
3. Redefinir o âmbito do pacote de cuidados que o SNS garante, alargando substancialmente nos cuidados primários e continuados e limitando a utilização inapropriada de meios sofisticados (ex. hospitais);
4. Continuar o caminho de contratualização exactamente como tem sido efectuado: contratos com entidades públicas (HH EPE e USF/CS) e instituições privadas (sociais) que disponham dos requisitos necessários de qualidade (alargamento progressivo do horizonte temporal);
5. Extinguir a prazo os Subsistemas públicos, fomentando a criação de uma Organização Integrada de Cuidados para todos os funcionários: Estado pagaria uma % fixa anual, os beneficiários contribuiriam de modo a garantir o equilíbrio financeiro da OIC;
6. Continuar as medidas na área difícil do medicamento;
7. Etc., etc...
A agenda sendo essencial é também longa e complexa, daí exigir-se um adequado planeamento e gestão da mudança.
Pela sua importância nacional todos desejamos sucesso pleno ao Sr. MS, o apoio no terreno sem dúvida que lho daremos porque doutro modo é o nosso SNS que ficará em causa!
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