sábado, setembro 17, 2005

Correia de Campos

Competência técnica, incompetência política
Após cerca de 5 meses de Governo, poderíamos resumir a actuação de CC dizendo que começam a ver-se agora (só agora!) alguns sinais de competência técnica aliados, porem, a uma grande incompetência política. O que não é bom e pode vir a trazer dissabores irremediáveis num futuro próximo, se tivermos em conta que CC não perseguiu maior objectivo na vida do que preparar-se/projectar-se para ser Ministro da Saúde. Ficará na história? Temo que não. Vejamos:
1º- Sinais de competência técnica:
a)- Os objectivos estratégicos definidos nas GOP parecem-me muito acertados e tecnicamente correctos (aumentar os ganhos em saúde, reforçar os mecanismos de planeamento estratégico dos recursos, melhorar o acesso e reforçar a qualidade, reduzir a despesa do Sistema de Saúde);
b)- Igualmente correcta é a aposta nas acções de promoção da saúde e na prevenção da doença, através da aplicação do Plano Nacional de Saúde e do desenvolvimento de um conjunto de serviços e instrumentos de saúde pública. Sobressai aqui claramente o conceito de Nova Saúde Pública, fundado, por sua vez, no conceito de Promoção da Saúde, da Carta de Otava de 1987 (diferente do paradigma de Saúde Pública, higienista, vindo do século XIX);
c)- Tecnicamente correcto é ainda o papel central atribuído aos Cuidados de Saúde Primários, a afirmação pela natureza pública dos hospitais, a contratualização interna, as ULS, as agências de contratualização dos serviços de saúde, a Carta Nacional de Equipamentos, a reactivação dos centros de responsabilidade integrada, etc. etc.
São falhas técnicas a ausência de referência a qualquer novo modelo de gestão dos serviços de saúde, em especial dos hospitais, a excessiva ênfase na formação, a referência à avaliação de desempenho e ao recurso ao Contrato Individual de Trabalho, sem qualquer indicação quanto a carreiras, condições de trabalho, regimes de trabalho, etc.

Finalmente, parece que começamos a perceber onde CC quer chegar em pontos essenciais e, no essencial, estamos de acordo quer com os objectivos quer com as acções previstas.
Não estamos, porém, de acordo com a gestão política do Ministério da Saúde.
2º - Incompetência política:
a) - A não ser agora, em que começa a perceber-se alguma estratégia, CC não tinha qualquer estratégia definida. Mesmo agora a estratégia é ainda totalmente desconhecida pela generalidade dos portugueses;
b)- Existiram, e continuam a existir inúmeros problemas de comunicação e de marketing na gestão da política de saúde, sobretudo por parte do próprio Ministro quando diz coisas absurdas e impensadas. E na maneira como as diz: o discurso na tomada de posse do novo Conselho de Administração do HSJ e a entrevista ao JN, são dois dos exemplos mais paradigmáticos.
c)- A recondução dos CAs do HH SA, sobretudo daqueles totalmente identificados com a política anterior e com o seu antecessor e, pior ainda, de todos os comissários políticos sem qualquer conhecimento de gestão hospitalar nem ligação anterior com os hospitais;
d)- A não extinção da Unidade de Missão e a manutenção no cargo até à data do eng.º Pedroso Lima;
e)- A ausência completa de qualquer palavra de estímulo aos funcionários dos serviços de saúde, em especial dos Hospitais SA vítimas, sobretudo aqueles em regime de função pública, do mais aviltante enxovalhamento profissional;
f)- O não querer informar-se sobre o que se passa nos HH SA para além dos relatórios facciosos que os CAs lhe fazem chegar às mãos;
g)- O modo como geriu o processo de demissão da ERS, do Presidente da Comissão de Luta contra a SIDA e do Infarmed, não o dignificaram como pessoa;
h)- A manutenção do anterior Director Geral de Saúde e dos subdirectores gerais;
i)- O silêncio que mantém sobre a carreira de Administração Hospitalar;
j)- A total falta de controlo sobre os Hospitais SA;
k)- A ausência completa de qualquer dinâmica no funcionamento dos serviços de saúde. Deixou que a apatia e o deixar-andar se instalassem. Os próprios CAs dos HH SA queixam-se não só de nunca terem tido qualquer reunião com o Ministro como de nem sequer receberem qualquer orientação. Anda tudo em roda livre. Isso é sabido. Isso é comentado, e não abona nada a favor do Ministro
l)- O Ministério está sem liderança, os serviços estão sem orientações, os funcionários e utentes não sabem o que este Ministério anda a fazer, o que quer fazer;
m)- O Ministro apenas fala com os serviços através da imprensa e quando fala mais valia estar calado, na maioria das vezes;
n)- Instalou-se a boataria. Último sinal de que algo está podre no reino da Dinamarca.

Há que arrepiar caminho. A política, tal como a técnica, também se aprende.
Vivóporto