Mais satisfeitos...
Com a Saúde, mas esperam mais
Estudo nacional compara opinião dos portugueses com níveis de há sete anos e constata que recurso ao sector privado pouco aumentos.
Parece paradoxal: apesar de os portugueses constatarem que a demora na obtenção de alguns cuidados de saúde aumentou nos últimos sete anos, dizem estar mais satisfeitos com o sistema público de saúde, tanto que recorrem cada vez mais a ele. É uma das conclusões do estudo "O Estado da Saúde em Portugal", coordenado por Manuel Villaverde Cabral, sociólogo do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, uma encomenda do Ministério da Saúde.
A apresentação é hoje, numa conferência que assinala os 30 anos do Serviço Nacional de Saúde, no Centro Cultural de Belém, em Lisboa.
As mesmas perguntas feitas num estudo de 2001 foram repetidas entre 26 de Fevereiro e 15 de Abril do ano passado, por encomenda do então ministro da Saúde, António Correia de Campos. Neste período, houve fecho de maternidades, de urgências, iniciou-se a reforma dos centros de saúde e os medicamentos começaram a ser vendidos fora das farmácias. Villaverde Cabral diz, ainda assim, que o estudo não pode ser visto como uma avaliação das reformas mas sim como um inquérito à percepção das pessoas de acordo com o seu conhecimento pessoal do sistema.
O subtítulo do estudo, cuja autoria inclui também o sociólogo Pedro Alcântara da Silva, é Acesso, Avaliação e Atitudes da População Portuguesa em relação ao Sistema de Saúde – evolução entre 2001-2008 e comparações regionais.
Foram inquiridos 3039 portugueses, uma amostra representativa da população portuguesa.
Quando se pergunta como avaliam globalmente o desempenho do sistema de saúde naquele período de tempo os portugueses “manifestam actualmente uma opinião mais negativa”, lê-se no estudo. Mas Villaverde Cabral explica que uma pergunta tão genérica, numa amostra que inclui pessoas que nunca tiveram contacto com o sistema público, é mais permeável ao discurso mediático centrado no que corre mal.
Quando se pergunta como avaliam globalmente o desempenho do sistema de saúde naquele período de tempo os portugueses “manifestam actualmente uma opinião mais negativa”, lê-se no estudo. Mas Villaverde Cabral explica que uma pergunta tão genérica, numa amostra que inclui pessoas que nunca tiveram contacto com o sistema público, é mais permeável ao discurso mediático centrado no que corre mal.
O sociólogo considera mais fiáveis indicadores concretos que perguntam sobre experiências directas. E aqui as respostas revelam que os portugueses têm uma opinião tendencialmente mais positiva do que em 2001. Por exemplo, nas consultas externas hospitalares, à pergunta se estavam satisfeitos ou muito satisfeitos, 44,2 por cento dos inquiridos dizem agora que sim, face a 32,3 por cento em 2001. Nas urgências os satisfeitos ou muito satisfeitos subiram para 44,7 por cento em relação aos 39 por cento de há sete anos.
Os inquiridos dão também uma nota mais positiva no que diz respeito aos cuidados prestados, ao tempo que lhes é dedicado e à forma como são tratados pelos médicos.
Mas a bondade deste tipo de avaliação, explica Villaverde Cabral, deve-se, em parte, a um fenómeno psicológico conhecido como “efeito da gratidão”, que faz com a avaliação dos cuidados prestados seja tendencialmente positiva.
Os inquiridos dão também uma nota mais positiva no que diz respeito aos cuidados prestados, ao tempo que lhes é dedicado e à forma como são tratados pelos médicos.
Mas a bondade deste tipo de avaliação, explica Villaverde Cabral, deve-se, em parte, a um fenómeno psicológico conhecido como “efeito da gratidão”, que faz com a avaliação dos cuidados prestados seja tendencialmente positiva.
O estudo detecta alguns “constrangimentos ao nível do acesso” e aqui a avaliação dos portugueses passa a ser “tendencialmente negativa”. As respostas apontam no sentido de que a acessibilidade aos cuidados disponíveis na zona onde habitam piorou, o que se verifica ao nível do médico de família, médicos especialistas, consultas e tratamentos hospitalares, bem como das urgências. Questionados sobre o que deveria melhorar em primeiro lugar, 43,2 por cento escolhem a redução dos tempos de espera para a obtenção de consultas e cirurgias.
O sociólogo assinala como progresso a grande descida no número de portugueses que dizem não ter médico de família, de 15,1 por cento para 7,9 por cento.
E, mesmo assim, desvaloriza os sem médico, afirmando que os dados demográficos recolhidos demonstram que são sobretudo jovens e pessoas que mudam com mais frequência de casa.
O sociólogo assinala como progresso a grande descida no número de portugueses que dizem não ter médico de família, de 15,1 por cento para 7,9 por cento.
E, mesmo assim, desvaloriza os sem médico, afirmando que os dados demográficos recolhidos demonstram que são sobretudo jovens e pessoas que mudam com mais frequência de casa.
Maior cobertura e maior procura – o recurso a consultas nos centros de saúde aumentou 20 por cento – significaram maior demora, interpreta Villaverde Cabral, como explicação para o facto de vários indicadores de acesso aos centros de saúde terem piorado. Enquanto em 2001 cerca de metade dos inquiridos (49,1 por cento) conseguia a sua consulta para o próprio dia da marcação, em 2008 essa percentagem cai para pouco mais de um quarto (29,9 por cento), agravando-se o tempo de espera. Esta tendência é notória no número de inquiridos que dizem ter esperado mais do que três semanas para serem vistos por um médico: de 34 por cento para quase 39,7 por cento. O descontentamento face a esta demora é maior no Alentejo e na região de Lisboa e Vale do Tejo. Ainda assim, a satisfação global aumentou face ao último inquérito.
Seguros não aumentam
Nos hospitais, a tendência é a mesma: aumento da morosidade.
Os utentes que conseguem consulta no espaço de um mês desceram de 58,5 para 38 por cento, mas verifica-se que durante este período houve como que “um ajuste da expectativa” e, apesar de a espera ter aumentado, cresceu também a tolerância à espera, conclui o sociólogo e vice reitor da Universidade de Lisboa.
Os utentes que conseguem consulta no espaço de um mês desceram de 58,5 para 38 por cento, mas verifica-se que durante este período houve como que “um ajuste da expectativa” e, apesar de a espera ter aumentado, cresceu também a tolerância à espera, conclui o sociólogo e vice reitor da Universidade de Lisboa.
A abertura de um número crescente de unidades privadas de saúde poderia fazer crer que os portugueses recorrem cada vez mais ao privado. Este estudo refuta essa ideia. Há sim um recurso crescente ao público – passou de 84,8 por cento para 89,9 por cento – à custa da redução dos subsistemas de saúde, porque a ida ao privado permanece quase estável – passou de 0,8 por cento para 1,9 por cento.
Continua a ser residual e reservado a uma elite da população, com uma maior utilização na região de Lisboa. De acordo com o estudo, o mesmo é verdade para os seguros de saúde: não aumentaram – andam à volta dos 11 por cento –, passaram foi de seguros da empresa para privados e estão sobretudo na mão de homens, entre os 30 e 49 anos, mais escolarizados, de estatuto socioprofissional mais elevado. Villaverde Cabral nota que “todas as esperas susceptíveis de serem encurtadas com recurso ao privado introduzem desigualdade”, apontando para “a fuga às listas de espera por parte dos que podem pagar”. Os inquiridos que nunca fizeram cirurgias fora do público desceram de 93,1 por cento para 91,6 e as consultas da especialidade são a grande fonte de procura, de 72 por cento para 78,9. Os investigadores sugerem mesmo que uma forma de aumentar “a equidade social no acesso às consultas de especialidade de cirurgias pode passar por convenções com profissionais e estabelecimentos de saúde ou do sector social”, a exemplo do que já sucede para alguns exames médicos.
Catarina Gomes, JP 08.07.09
Catarina Gomes, JP 08.07.09
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