Ainda as Maternidades
Não é por haver maternidade na terra que os adultos jovens ou menos jovens desatam a procriar. Os factores do actual declínio da natalidade têm a ver com um conjunto alargado de motivos, sendo o mais importante a dificuldade em assegurar maternidade e paternidade responsáveis. Um jovem casal condiciona a sua descendência aos apoios que tenha para cuidar dos filhos, não à existência de maternidade na terra.
Durante os seis meses que decorreram desde o anúncio da concentração de salas de parto, pode dizer-se que a grande maioria da opinião publicada apoiou a medida ou, pelo menos, deu-lhe o benefício da dúvida. Todavia, três ideias contrárias tiveram algum trânsito: o factor principal não seriam a segurança e qualidade do parto, mas sim as razões económicas; a concentração de maternidades, a par de correios, escolas e tribunais, iria dificultar o desenvolvimento do interior; e, mais recentemente, a ideia de que a concentração geraria a baixa da natalidade, em zonas do interior, já envelhecidas em relação à média nacional. Nenhum destes argumentos é sustentável, nem material, nem politicamente.
A questão da economia de recursos (“economicismo”, para alguns) não é vergonha, é obrigação. Mas, neste caso, não foi assim. Tanto agora, como em 1999 ou em 1989, o poupar não foi determinante. Em 1989 e 1999 não era sequer preocupação nacional. Agora é-o e de que maneira. Mas a racionalidade do estudo da comissão técnica assenta na qualidade dos cuidados. E a racionalidade política apoia-se na igualdade de cuidados de qualidade, para iguais necessidades. Acontece que em 2006 há um elemento novo: a escassez progressiva de médicos obstetras e a nula atracção que salas de parto com poucos doentes exerciam sobre internos de especialidade, impedindo a renovação de gerações de especialistas para trabalho em pequenas maternidades.
O argumento da indispensabilidade de salas de parto nas pequenas cidades, estações de correios e escolas em todos os lugares e tribunais em todas as unidades judiciais, como factor de desenvolvimento é inconsistente e perigoso. Inconsistente, pois não são serviços adjectivos que desenvolvem substantivamente o país. São agriculturas, indústrias e serviços capazes de aliar o sentido de risco à inovação e ao aproveitamento de condições, antes ignoradas. Perigoso, pois não é semeando serviços administrativos ou sociais, desnecessários no contexto, que se desenvolve o interior. Só aumentam a ineficiência, o desperdício e até a ociosidade. Pelo contrário, serviços novos terão de ser criados para apoiar os idosos válidos ou de mobilidade limitada, unidades móveis de saúde para as aldeias recônditas, apoio e vigilância de saúde ao turismo residencial, sobretudo o de terceira idade, hospitais pequenos, ditos de proximidade, vocacionados para cuidados rápidos a turistas de curta duração e a residentes e sedentários citadinos em fim-de-semana. A adequação de tais cuidados às reais necessidades é que gera o desenvolvimento económico, não a sobrevida desesperada de unidades menos necessárias em qualidade insuficiente ou descendente.
Finalmente o argumento, este mais recente, do risco de se acentuar a baixa de natalidade com a concentração das salas de parto. Nada mais infundamentado. Não é por haver maternidade na terra que os adultos jovens ou menos jovens desatam a procriar. Os factores do actual declínio da natalidade têm a ver com um conjunto alargado de motivos, sendo o mais importante a dificuldade em assegurar maternidade e paternidade responsáveis. Um jovem casal condiciona a sua descendência aos apoios que tenha para cuidar dos filhos, não à existência de maternidade na terra.
Se quisermos passar dos 1,4 para 1,8 filhos por mulher em idade fértil, temos de facultar mais condições a jovens mães e pais para continuarem a exercer a sua função laboral e social: apoios de guarda de criança, no dia inteiro ou só em parte; locais de guarda e convívio de crianças em todos os centros comerciais e hipermercados, teatros, cinemas, festividades; desenvolver o baby sitting com formação e supervisão adequadas e apoio à amamentação em todos os locais de trabalho, universidades e bibliotecas de maior dimensão; reforço do pré-escolar no horário de funcionamento e, certamente, também, apoio financeiro ao segundo e terceiro filhos.
Muito está por fazer, certamente. Mas não nos podemos dar ao luxo de prolongarmos a inadequação das actuais engrenagens sociais de apoio, ignorando a mudança no ambiente e as novas necessidades que dela decorrem.
CC, JP 22.09.06
Durante os seis meses que decorreram desde o anúncio da concentração de salas de parto, pode dizer-se que a grande maioria da opinião publicada apoiou a medida ou, pelo menos, deu-lhe o benefício da dúvida. Todavia, três ideias contrárias tiveram algum trânsito: o factor principal não seriam a segurança e qualidade do parto, mas sim as razões económicas; a concentração de maternidades, a par de correios, escolas e tribunais, iria dificultar o desenvolvimento do interior; e, mais recentemente, a ideia de que a concentração geraria a baixa da natalidade, em zonas do interior, já envelhecidas em relação à média nacional. Nenhum destes argumentos é sustentável, nem material, nem politicamente.
A questão da economia de recursos (“economicismo”, para alguns) não é vergonha, é obrigação. Mas, neste caso, não foi assim. Tanto agora, como em 1999 ou em 1989, o poupar não foi determinante. Em 1989 e 1999 não era sequer preocupação nacional. Agora é-o e de que maneira. Mas a racionalidade do estudo da comissão técnica assenta na qualidade dos cuidados. E a racionalidade política apoia-se na igualdade de cuidados de qualidade, para iguais necessidades. Acontece que em 2006 há um elemento novo: a escassez progressiva de médicos obstetras e a nula atracção que salas de parto com poucos doentes exerciam sobre internos de especialidade, impedindo a renovação de gerações de especialistas para trabalho em pequenas maternidades.
O argumento da indispensabilidade de salas de parto nas pequenas cidades, estações de correios e escolas em todos os lugares e tribunais em todas as unidades judiciais, como factor de desenvolvimento é inconsistente e perigoso. Inconsistente, pois não são serviços adjectivos que desenvolvem substantivamente o país. São agriculturas, indústrias e serviços capazes de aliar o sentido de risco à inovação e ao aproveitamento de condições, antes ignoradas. Perigoso, pois não é semeando serviços administrativos ou sociais, desnecessários no contexto, que se desenvolve o interior. Só aumentam a ineficiência, o desperdício e até a ociosidade. Pelo contrário, serviços novos terão de ser criados para apoiar os idosos válidos ou de mobilidade limitada, unidades móveis de saúde para as aldeias recônditas, apoio e vigilância de saúde ao turismo residencial, sobretudo o de terceira idade, hospitais pequenos, ditos de proximidade, vocacionados para cuidados rápidos a turistas de curta duração e a residentes e sedentários citadinos em fim-de-semana. A adequação de tais cuidados às reais necessidades é que gera o desenvolvimento económico, não a sobrevida desesperada de unidades menos necessárias em qualidade insuficiente ou descendente.
Finalmente o argumento, este mais recente, do risco de se acentuar a baixa de natalidade com a concentração das salas de parto. Nada mais infundamentado. Não é por haver maternidade na terra que os adultos jovens ou menos jovens desatam a procriar. Os factores do actual declínio da natalidade têm a ver com um conjunto alargado de motivos, sendo o mais importante a dificuldade em assegurar maternidade e paternidade responsáveis. Um jovem casal condiciona a sua descendência aos apoios que tenha para cuidar dos filhos, não à existência de maternidade na terra.
Se quisermos passar dos 1,4 para 1,8 filhos por mulher em idade fértil, temos de facultar mais condições a jovens mães e pais para continuarem a exercer a sua função laboral e social: apoios de guarda de criança, no dia inteiro ou só em parte; locais de guarda e convívio de crianças em todos os centros comerciais e hipermercados, teatros, cinemas, festividades; desenvolver o baby sitting com formação e supervisão adequadas e apoio à amamentação em todos os locais de trabalho, universidades e bibliotecas de maior dimensão; reforço do pré-escolar no horário de funcionamento e, certamente, também, apoio financeiro ao segundo e terceiro filhos.
Muito está por fazer, certamente. Mas não nos podemos dar ao luxo de prolongarmos a inadequação das actuais engrenagens sociais de apoio, ignorando a mudança no ambiente e as novas necessidades que dela decorrem.
CC, JP 22.09.06
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