domingo, julho 17, 2005

Dez conselhos

Apresento-lhe, meu caro Professor, dez conselhos para poder melhorar o seu desempenho no novo cargo que há quatro meses assumiu. Espero que os considere como uma prova de amizade.

1º Esqueça a missão. Concentre-se antes em definir com clareza os objectivos para estes quatro anos e a estratégia para os alcançar. Identifique bem as suas tropas, prepare-as e vá à luta. Não avance sozinho e muito menos não queira ganhar a guerra com os soldados do inimigo. Garanto-lhe que esta não é a guerra do Solnado. À primeira oportunidade cilindram-no. Não pense que pode com isso. Vai ver, quando ficar sozinho, como é mais frágil do que julgava. É importante que as tropas conheçam bem os objectivos e a estratégia. Não deixe que continue por mais tempo a incerteza, a desorientação e a confusão que deixou criar com tanto silêncio ruidoso;

2º Siga como linha de rumo o interesse público, a imparcialidade e a defesa dos que têm menos voz no que se refere aos destinatários da sua política. Quanto aos agentes que a vão levar a cabo, não conte em ser neutro nem conte com neutralidades. Decida como eles decidiram, faça como eles fizeram. Eles não têm medo de exercer o poder. Eles sabem quem abater, como abater, quando abater. Sempre o fizeram e voltarão a fazer à primeira oportunidade. O lirismo e os pruridos de esquerda nunca deram qualquer resultado;

3º Não se esqueça que a maioria absoluta do eleitorado votou no seu partido, que nessa maioria estará seguramente a maioria absoluta dos funcionários dos hospitais. Todos esperam por mudanças de políticas e de protagonistas. É um erro político crasso pensar que recauchutando as políticas e mantendo os velhos protagonistas motiva o seu eleitorado, motiva os trabalhadores da saúde. Aprenda a conhecer os seus trabalhadores, informe-se (tem muito boa gente no terreno capaz de o informar correctamente do que se passa cá em baixo) e vai ver como as pessoas estão desgostosas, muitas estão mesmo a ser vítimas de terrorismo psicológico no trabalho apenas pelo crime de serem funcionários públicos. Não deixe que continue a evoluir o sentimento anti-função pública (e sobretudo anti-administradores hospitalares. Peça um relatório através da APAH sobre o nº de AH que estão na prateleira) que se iniciou com os Hospitais SA. A maioria dos trabalhadores dos hospitais são ainda funcionários públicos e não se pode governar/gerir contra a maioria. O que está a acontecer ao ânimo das pessoas é criminoso;

4º Legisle o que tem de legislar. Mas não peça ao inimigo para o fazer por si. Há bons juristas de esquerda, capazes de perceber bem o que o senhor quer e de produzir um resultado muito melhor dos que os homens da Unidade de Missão. Os homens da Unidade de Missão não são indispensáveis. Quando começaram nem sequer sabiam o que era um hospital. Na legislação a publicar, não se esqueça da promessa já feita, de revalorizar a carreira de AH e de reposicionar os AH nos seus lugares. Não se trata de uma questão de dinheiro, mas de redignificar uma profissão que o Senhor ajudou a criar. Afinal trata-se da sua gente!

5º Não deixe crescer mais a Administração Central, sim. É correcto. Mas mande ver quantas admissões em regime de CIT se fizeram neste dois últimos anos e continuam a fazer-se, desnecessárias, por mero compadrio, por nepotismo, por clientelismo político, a maioria das quais sem respeito pelos princípios da publicidade e da transparência e com vencimentos iguais ou acima dos AH de carreira. Corte nas despesas, há muito por onde cortar sem qualquer prejuízo para o bom funcionamento dos serviços (p. ex., no nº de CA, criando ULS EPE em vez de HH EPE, no nº de membros dos CA, criando órgãos individuais de Administração nos Hospitais, Director-Geral do Hospital, nomeando para o efeito, por concurso, AH de carreira). Mande vender todos os carros topo de gama recentemente adquiridos. Não fazem falta nenhuma. Acabe com os vencimentos e as mordomias vergonhosas que se pagam nos HH SA. Mas não deixe cortar o fornecimento de água potável, nem deixe coartar o direito dos funcionários públicos à formação nem à progressão nas respectivas carreiras (já não se questiona a questão das progressões automáticas);

6º Não perca tempo com a casa dos outros. Há muito que fazer na nossa. Não dispare para todo o lado. Pense antes de falar, não fale antes de pensar. Já viu como a comunicação social gosta de si. É mau sinal. Estão sempre à espera de um deslize. Guie-se pela máxima do revolucionário que dizia que «a melhor maneira de dizer, é fazer!»;

7º Não se poupe a informar-se. Faça-o com método, com carácter sistemático, com carácter pró-activo e não reactivo, com intenção de corrigir e não de punir, com uma intenção positiva e não negativa, levando as pessoas à participação e não à delação. Mande efectuar inquéritos e sondagens junto dos trabalhadores dos serviços de saúde para sentir o pulsar frequente dos trabalhadores. Crie um sistema do tipo utilizado pelos hospitais franceses para avaliação do Clima Social (mas para uso do Ministério). Crie um sistema (através de um impresso com situações relevantes pré-tipificas) de Notificação de Comunicações de Situações verificadas nos hospitais (ou outros serviços de saúde) e mande criar uma base de dados, publicando-os e tomando as medidas que se impuserem. Dê voz aos «que têm menos voz»;

8º Visite mais os Serviços de Saúde. Mas não se deixe receber apenas pelos respectivos CA e por todos os penduras que sempre aparecem nessas ocasiões. Receba, por sua iniciativa, e em privado, em audiências curtas, figuras de relevo (no sentido de relevantes, não de importantes) dos respectivos serviços, com questões precisas e uma questão aberta, mandando avisar as pessoas com antecedência. O Senhor Prof. vai ver como há pessoas com muito para dizer, com uma visão das coisas muito diferente por vezes da do «aparachik»;

9º Confie na sua gente, mais do que na outra gente. Sua gente, antes de mais, são todos quantos foram seus alunos. A relação professor-aluno, como sabe, é muito forte e, com raras excepções, perduram, são de confiança;

10º Não se esqueça, que todos nós, os seus amigos, gostaríamos de o ver triunfar, para bem da Saúde dos Portugueses e do País. Os outros, esses, apenas estão à espera de o ver cair.

Senhor Professor, espante-nos.

Vivóporto