sábado, julho 30, 2005

Cinco Tópicos

Para uma conversa solta em tom irónico e muita revolta contida.
Do Prof. Bitaites. Ao Ministro da Saúde.
1ª- Quanto à Política.
Quanto mais neutra e asséptica melhor. Faça que faz, mas não faça. Diga de vez em quando umas atoardas para os distrair. De Gaulle praticou durante alguns meses, na CEE, a «política da cadeira vazia», V. Ex.ª pratique, de vez em quando, a sua, original, «política da cadeira partida». Ponha-os a falar do acessório. Vá fazendo o que lhe parece melhor, fazendo orelhas moucas: nomeie uns grupos de trabalho, mas esqueça logo o que eles propuserem, mude aqui e ali umas pessoas, mas deixe na sua maioria os que foram nomeados pelos outros (assim ficarão, eles, os da oposição de direita, menos à vontade para o criticar), nomeie para cada Conselho de Administração, sempre que possível, um médico da casa (esbate logo um chorilho de críticas da instituição, em especial dos médicos), um correligionário do Partido (esbate logo um chorilho de críticos do Partido), um Administrador Hospitalar (esbate por completo a crítica da APAH e de alguns - muitos? poucos? - administradores hospitalares)

2ª- Quanto à Estratégia.
A melhor estratégia é não ter estratégia nenhuma. Desde logo, para definir uma estratégia é preciso ter capacidade estratégica («consiste em pensar criativamente acerca do rumo que acreditamos que a organização (…) deve tomar. Trata-se de uma visão a longo prazo acerca do que terá de acontecer no futuro para garantir um sucesso continuado»), o que não é para qualquer um, e em política não compensa. Basta o bater da asa de uma borboleta (p. ex., um inocente artigo num jornal) e no dia seguinte um Ministro pode ter de pedir a demissão. Vale a pena? Deixe que seja cada um dos dirigentes do Ministério (gestores dos HH SA, p.ex.) a definir, eles próprios – e só eles - a sua estratégia. Na carta de missão, p.ex. São eles e não V. Exª que devem dizer o que precisa ser feito, porque razão é necessário, como deve ser feito, quem o fará, quando deve ser feito. Já viu, não lhe dá trabalho nenhum e ainda por cima, daqui a noventa dias, se não cumprirem o que eles próprios disseram que queriam fazer, V. Ex.ª pode substitui-los. Não dá trabalho, é barato e dá sempre jeito para correr com eles, se for preciso. Pode discordar-se do método, mas que ele tem muitas virtudes, lá isso tem!

3ª- Quanto a questões de Mudança.
Não acredite naquele Professor que disse que «se houver meios para acompanhar, controlar e corrigir os erros de percurso de uma mudança brusca, ela pode superar a mudança lenta em vantagens». As mudanças querem-se sempre lentas, muito lentas, mesmo que haja meios para acompanhar, controlar e corrigir os erros. Razão tinha o Dr. Poole da Costa. As mudanças podem ser perigosas, geram instabilidade. Não é verdade que o País quis mudanças quando deu a maioria absoluta ao PS. O que em Portugal se pretende amiudadas vezes - e as eleições são apenas um pretexto - é mudar a cara das pessoas que estão no governo, não as políticas. Só os chatos dos comunistas é que estão sempre a querer mudar de políticas. Eva foi feita da costela de Adão, nós, portugueses herdámos esta costela anarco-divina. Portugal é um país no feminino e com uma costela anarquista, graças a Deus. Não queira mudar as políticas, não queira mudar os HH (de SA para EPE ainda vá que não vá, as mudanças são quase nenhumas), não queira mudar os gestores, mesmo com os problemas que isso lhe possa trazer; mude apenas aqueles onde sabe que pode melhorar, que são poucos, não vê como está tudo a ir tão bem («há uma cultura de responsabilidade e de gestão que é visível, por exemplo nos hospitais SA» – só não vê quem não quer ver!)? Acredito no que o Senhor Ministro diz, todos devemos acreditar, ou será que os Ministros do PSD e do PS alguma vez seriam capazes de brincar com esta coisa dos HH SA ou EPEs? Nunca, sou capaz de jurar!

4ª- Sobre os Recursos Humanos da Saúde.
Em relação aos RH da Saúde adopte a política do insigne Professor que defendia:
a)- relativamente aos gestores: quanto àqueles que tiver de nomear fora da casa, ter em atenção que «os novos gestores, vindos de fora do sector da saúde, podem trazer ideias novas, fertilizando um terreno habituado longo tempo a uma só cultura». Aqui V. Ex.ª sabe do que fala, pois, uma vez que desenvolveu toda a sua carreira na Administração Pública, conhece bem o terreno que pisa; além disso, como já vimos, «os gestores vindos de fora vão estar submetidos não apenas às consequências dos erros próprios, mas ainda à agressão daqueles que se sentem afectados no seu poder interno». Como até agora não erraram e ainda não foram agredidos, há que esperar pela melhor oportunidade para correr com eles, o que ocorrerá em breve. Poderá ser daqui a três meses. O insigne Professor antes falava em cerca de um ano, o que já é um grande ganho: «parte dos dirigentes agora nomeados já não estarão em funções ao fim de um ano (…) por desajustamento às funções, frustração pessoal, incapacidade intrínseca, exoneração pelas razões previstas na lei. Outros estarão realizados, produtivos e aceites pelo tecido institucional». Felizmente que todos - quase todos! – são gente inteligente, flexível, «com capacidade de liderança, inovação, assumir riscos e gerir conflitos». Têm-se aguentado bem, por isso! Mas ainda assim mantenha-os debaixo da «espada de Dâmocles» com a carta de missão, especialmente aos novos nomeados, sem provas dadas. E sobretudo aos AH, os que andam a dizer que «são a sua gente» (que atrevimento!), sobretudo os que não puderam deixar de ser nomeados, para calar a APAH.
É importante não esquecer ainda a propósito dos gestores mais dois aspectos: 1º)- criar rapidamente mecanismos que cerceiem «a vulnerabilidade que a nomeação livre e incondicionada oferece ao partidarismo, amiguismo, incompetência, fraude, corrupção e a todas as habituais consequências dos processos de escolha a grande distância do mecanismo eleitoral de legitimidade democrática, em contexto de insuficiência fiscalizadora e de escassa responsabilidade social»; 2º)- não esquecer também que os (todos os) médicos que foram alunos, no Pós-Graduação para Gestores Clínicos na ENSP, nos últimos três anos, estão muito bem preparados, com garantias ministeriais de terem «condições para desempenhar com competência responsabilidades de administração» enquanto que «nem todos os administradores (hospitalares? Onde falhou neste caso a formação da mesma ENSP?) são bons gestores»
b)- relativamente ao restante pessoal: deve procurar fazer-se tudo o que for necessário para libertar os redundantes e desnecessários, tacitamente aconselhar os mais passivos (talvez os funcionários com problemas de saúde, os mais idosos, os menos qualificados?) «a abandonarem o estabelecimento, como por selecção natural» (cuidado, porém, não repetir isto, na qualidade de governante, em nenhum escrito ou verbalmente em público perto de jornalistas!), ou seja, pelos seus próprios pés (dá jeito a este propósito, ler um livro chamado Assédio Moral no Trabalho, da editorial Pergaminho, para aprender uns truquezitos. Os gestores inovadores vindos da privada já sabem como se faz!) e induzir os melhores, «ou pelo menos os mais interessados num desempenho bem qualificado, a ficarem». Quanto a incentivos, é fundamental, também, que eles, por definição «não podem abranger todos os funcionários, mas só uma parte deles, para que sejam realmente discriminantes» (atenção, um socialista deve evitar sempre este tipo de discurso!).
5ª- Quanto à avaliação do Desempenho dos Gestores.
Sei que a carta de missão que «todos os gestores que foram nomeados trouxeram (!??) [e redigiram por conta própria. Como?], no acto de posse (!??)», «onde cada um promete (!??) o que vai cumprir (não posso acreditar!), de acordo com os objectivos a alcançar em metas que estão quantificadas (é segredo de estado? Alguém os conhece? Alguém participou na sua definição - « nada mais deletério para a moral interna da organização do que constatar prioridades invertidas») será revista daqui a noventa dias. Mas os objectivos são apenas de produtividade e económico-financeiros ou haverá outros tão ou mais importantes: indicadores do clima social? Indicadores de satisfação (dos profissionais e dos utentes?). Sim, porque «agressividade desnecessária contra o irracional» (!?) ou a «tolerância excessiva face a supostas (!??) especificidades», «a liberdade que se reputa excessiva na nomeação e demissão das chefias intermédias (uff! Felizmente isto já não é assim!), podem ser «fonte de arbítrio e geração de potenciais resistências passivas», de desmotivações mortais para a organização (a propósito, o que tem sido feito de inovador, nestes últimos quatro meses, nos hospitais em geral, e sem ser de inovador, melhor perguntando: tem-se feito alguma coisa nos hospitais ultimamente?).

O futuro dos hospitais pode estar seriamente comprometido a muito curto prazo e não é com o arrocho que isto lá vai, isso garanto eu!

Bibliografia utilizada: António Correia de Campos, «Hospital-empresa; crónica de um nascimento retardado», Revista Portuguesa de Saúde Pública, Vol. 21, nº1 – Janeiro/Junho 2003 e Notícias-Magazine, entrevista a António Correia de Campos, suplemento do JN, de 24 de Julho de 2005.
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